segunda-feira, dezembro 15, 2003

Recorde Mundial

Ao ler esta entrada de José Carlos Barrros, e ao fazer as contas para tentar perceber como é que seis mil pessoas em infracção simultânea ao código da estrada seriam mesmo um recorde mundial, ocorreu-me a história que o Pedro Castello Lopes nos contou ontem. Há uns anos um amigo do Pedro - que tinha um dia escrito uma tese sobre a teoria dos contrários - chegou ao pé dele perturbadíssimo. Não conseguia dormir ía para duas semanas e não sabia como recuperar o sono, já que de dia para dia se sentia mais angustiado. "- Mas então, o que te preocupa assim tanto? - É terrível: apercebi-me de repente que há muitos mais mortos que vivos. E cada vez aumenta mais o fosso ." O Pedro, excelente homem como comprovam os que com ele privam, andou meio desorientado. Se o seu amigo se tinha especializado em contrários ele apaixonara-se pelo ninguém pensa ( cujo opúsculo máximo, em devir, é o blogue em que o Pedro se dedica a reflectir sobre algo em que ninguém pensa ou fala: o que se passava em Gomorra?). E ele sabia que o problema do seu amigo era um falso problema. Havia, haveria, há, um outro problema que, ao ser descoberto não só alivia o problema anterior, como acende uma luz, uma lamparina no coração dos aflitos. Agora posso-o confessar, Pedro é a pedra de uma nova filosofia de que ninguém, senão ele, pretende falar. E tanto pensou sobre o assunto que encontrou uma solução. Apressou-se a contá-la ao amigo, já postrado no leito de um sofrimento incomensurável: "- Já descobri porque é que tu andas assim. Toda a gente diz que a morte é o contrário da vida e aí tu tens razão, há mais mortos que vivos. Mas ninguém pensa que o contrário da morte não é a vida, é o nascimento. Aos morridos opoêm-se os nascidos e não os vividos, muito menos os vivos. A vida, entre o nascimento e a morte não tem contrário. É aliás a única coisa que escapa à tua magnífica tese. - E daí? - E daí? Não estás a perceber? Se o contrário de mortos é nascidos, não há mais mortos que nascidos, pelo contrário, pois que estes sendo o mesmo número dos morridos são ainda mais porque têm também consigo os vivos." Não foram precisas vinte e quatro horas para que o amigo, soerguido por uma confiança indesmentível na vida, essa essência sem contrário - o que não quer dizer, sem dissidência - recuperasse as cores, os odores e esse afecto pelo travo amargi-doce deste cá andar.

Sem comentários: