terça-feira, abril 06, 2004
25.4 de 74/ 25.4 04. Trinta anos de Quê? - IV
Lembro-me do recolher obrigatório. Do mais de quatro pessoas juntas é considerado uma manifestação. Dos chaimites a passarem, a intervalos regulares, depois das 21h, na rua de cima. Era o tempo do COPCON. Sentados na relva a descortinarmos, de golpe em golpe, o sentido destas coisas. Ao fundo um chaimite. Separamo-nos. Três e dois, separados dez metros, a artitmética possível. É claro que eles não nos iram fazer nada. Éramos cinco miudos sem pelugem na revolução dos homens barbados e cabeludos. Mas na nossa cabeça afastámo-nos. Não sei se era o 28 de Setembro, o 11 de Março....não era decerto o 25 de Novembro. Esse só viria mais tarde. Ocorre-me como se fosse hoje a colina de homens a serpentearem os prédios em frente ao meu, na rua cidade da beira. Foram assim até ao Ralis. A guerra do Solnado. Mas ouviram-se tiros para o ar vindos do aeroporto. Salvas de canhão. A minha casa ficava num triangulo não perfeito entre o Aeroporto e os Ralis, estes mais ao fundo. Lembro-me claramente dos tiros e das salvas de canhão no Aeroporto. Havia fumo. Fogo. Não era a brincar. Não sei precisar quando. No 11 de Março eu e o Paulo pegámos nas nossas biclas, descemos quase toda a Rua Cidade da Beira, cortámos a direito em direcção aos bombeiros, fomos à Encarnação e fomos ter ao Ralis. Éramos gente na multidão. Anos mais tarde encontramo-nos nos relatos, nas provas testemunhais que nos chegam. O Carlos Fragateiro, com quem trabalho hoje, estava lá também, vi-o no outro dia na revista da Visão, ladeando Jean Paul Sartre. 25.4 de 74/ 25.4 04. Trinta anos de Quê? Há qualquer coisa de exaltante nisto. No 28 de Setembro fomos para cima do telhado xingar os aviões que passavam, tentar interceptar, com dois walk-talkies , comunicações com a torre de controle do Aeroporto. Já era hábito. Uma vez tivemos mesmo direito a Polícia a entrar pela rua. O que nós corremos. Saimos pelo 87, rastejámos pelo telhado rumo ao 88 e saímos pelo outro prédio, onde escondemos os nossos aparelhos. E depois, passando pelo meio da polícia, metemo-nos nas nossas casas. Debaixo das saias das nossas mães. Éramos tão pequeninos que ninguém dava por nós. Os policias, talvez por medo do ridiculo, procuravam sabotadores encorpados, não uma meia dúzia de putos charilas, macacos sem pila.
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