terça-feira, junho 08, 2004
Ân sia
1. Estremeço. De ânsia, de inquietude, não sei. Não sei. Passa-se tudo na minha cabeça e depressa demais. Momentos depois, minutos, por vezes horas, descubro o que me fez assim, assim, quase vertiginoso, na eminência de um desabamento. Por vezes foi um nada, um nada exponenciado num absoluto incontrolável. Quando tinha dez anos ia dar uns pinotes, comer açúcar, jogar futebol, gritar com os meus irmãos.
2. Dez anos depois, no começo da vintena, já acreditava que a ânsia era aquela energia donde beberia aquilo que eu pretendia fosse a expressão e revelação de mim (é preciso que o diga, aos vinte anos era bem mais pretensioso, dizia, a minha arte). Ainda a gritar, já não com os meus irmãos, agora com os meus demónios, na sala vermelha do Casarão Cor de Rosa da Comuna, ou no meu quarto, em frente da Princess, a máquina de escrever que era do meu pai e para mim passou, teclado hcesar, a minha primeira princesa a sério. Ou a dançar.
3. Mais dez anos à frente e o pc substituiu a princess. A minha princesa que fazia cem mil vezes menos ruído que o silêncio que deste martelar do tempo adveio. Ainda tinha uma perspectiva romântica deste estado de estremecimento, inquietação, é só inquietação, porquê não sei, só sei que não sei ainda, mas começava a abrandar, a ter receio, a respirar fundo, como é que eu fazia?, a procurar os meus karmas, a respiração, sempre o respirar, a pôr-me na sombra.
4. Agora, aos quarenta. A ansiedade é um estertor que se liga directamente ao centro do meu corpo, ao temor, ao tremor. A ansiedade é quando tremo, e ao dar-me conta, parece que tremo mais. Nervo agitado que me liga à vida, que me desliga dela.
5. O que é esta doença, este mal de ser? O quê, onde acontece? E teríamos de ter esta falha sismíca para sermos humanos? Poderíamos sê-lo sem estremecimento?
6. O elogio do desiquilibrio. Ocorre-me Pepe Monleon, à porta da sua casa em Madrid, despedindo-se, elogiando o desiquilibrio das suas análises, dos seus exames, suspeitando que daí é que lhe vinha a força, a vontade de investir na sucessão dos dias.
7. Cansaço. Esta guerra de cada um com o seu próprio corpo, êxegese dos sinais disponíveis, prostra-nos, deixa-nos prostrados. Hermenêutica tensionada pela prenúncia mais do que pela pronúncia, aliás, é quando é possível o pronunciar que o ser se aplaca, se distende, ganha confiança. Que ri. Vista deste lado a tempestade é suave, tranquilizadora, este azul que há aqui, mundo de mim para ti, fim de tarde, entardecer. Por mais violento que possa ter sido, o anseio é movimento. Azul alquebrado sobre a linha do horizonte...
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