sábado, outubro 02, 2004

Fazer-se de morto

Quase estremeço. O Peter Pan inclina a cabeça para trás e morre nos meus braços. Todo ele se dissidiu. Já não é mais do que um corpo inerte, sem vida, que tenho no meu colo. Stanislawski, grande mestre do teatro do século XX, autor de um método de representação que criou escola em todo o mundo, dizia aos seus actores: "-Trabalhareis arduamente. Trabalhareis sem denodo pra conquistardes o saber e o poder da transformação e mesmo assim nunca alcançareis a pura genialidade daquela criança que brinca." Que brinca ou que morre no meu colo. Estranho lugar onde a nossa infância desembocou. Às vezes leio aqui alguns textos e parece-me que nós estamos virados do avesso. Não estamos. Estamos já é, há muito tempo, há um tempo demasiadamente longo, a viver no avesso do mundo. O mundo com que sonhamos deveria ser aquele no qual viveríamos e aquele em que realmente vivemos, aquele que deveríamos imaginar. Para que a fantasia, tal como uma pintura rupestre, pudesse exercer a função que lhe destinam os compêndios que se destinam a esmiuçar a geneologia do (nosso) mundo: previsão e antecipação da catástrofe, da maldição.

1 comentário:

mfc disse...

Não, meu amigo, não morreu, não senhor!
O menino que viveu dentro denós TEM que estar vivo!
Sempre.