sexta-feira, outubro 15, 2004

Olha as estrelas no céu

Uma das melhores recordações que tenho das minhas brincadeiras com o Pedro é a de um pequeno brinquedo com caixinha de música que espelhava as estrelas no céu do quarto. Apagávamos as luzes, ficávamos ali deitados contra o chão, e íam correndo imagens de um pássaro, de uma ovelha, de um porco, de um pato sobre o céu estrelado. Começou por ser um jogo de adormecer. Ele deitado ou sobre o meu peito, ou aninhado no meu ombro. Por vezes fazia-me festas, outras agarrava-me nas suas mãos. As suas mãos pequenas, os seus dedos frágeis serão, desde agora até nunca mais deixar de ser, a minha melhor descrição para a ternura. O jogo ocupou rapidamente todo o tempo do nosso melhor mundo. A qualquer hora corríamos para o quarto e apagávamos as luzes, olha, vamos ver as estrelas no céu. Um dia avariou-se, tornou-se caprichoso. Por vezes corria a música, outras o céu surgia e desaparecia, o que se estragou foi o momento. O tempo, em tudo, como disse tão bem Sena*, não se repete. Mas reinventa-se e tantas vezes a partir dos rastos de luz, pigmentos incandescentes, que nos vão ficando neste lastro de vida. Vou comprar um hoje, antes de adormecer. Amarei assim (n) a tranquilidade das minhas noites. * Outros Lugares, Antologia Poética

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