segunda-feira, novembro 22, 2004
Nuremberga, ontem e hoje
Nuremberga sempre me perturbou.
Eu sei que não teria havido futuro na Europa e no próprio planeta, sem este Julgamento. Tratou-se de salvaguardar o mundo da erosão provocada pela catastrófe ética que foi o nacional socialismo. Mas essa foi a última maldição do nazismo. Obrigou-nos, obrigou as nossas democracias, obrigou as nossas sociedades e nações, a cruzarem-se com a possibilidade hipócrita que espreita sempre que um homem julga outro homem. Sendo que em Nuremberga por detrás dos carrascos, dos dementes, dos assassinos, foram também julgados povos, através de outros povos. Não poderia ter sido de outro modo. Não deveria ter sido de outra maneira. Depois do horror, da barbárie, do martírio, da devastação, do extermínio, não poderia ter sido de outra forma. E acredito, este Julgamento constituiu um esforço genuíno e generoso de procurar a Justiça. Era tudo tão inexpiável, tão dantesco, que só o ódio parecia poder purificar. Os próprios juízes que se sentaram nas cadeiras sabiam que não estavam a julgar outros homens. Era deus que castigavam e puniam. Foram corajosos, sábios e intérpidos, e não se esperava outra coisa de alguém que tinha nas mãos tal desafio. Não se sabe que futuro teria havido para o nosso mundo sem essa preocupação em florir a terra. Pode assim o mundo continuar de 1945 até quase aos nossos dias, crente no seu devir*.
Nuremberga sempre me perturbou.
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* É claro que hoje é esse futuro que está outra vez em causa e torna-se bem mais difícil esperar que ele possa ter um prosseguir à altura dos melhores momentos da experiência do homem neste mundo. Onde antes se fez Nuremberga hoje discute-se uma jurisdição internacional assente na cláusula que salvaguarde o mais forte, o mais poderoso, o mais letal da crítica e do juízo com que pretende legitimar a sua acção.
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1 comentário:
Actualmente, repete-se a história, só que agora todos se banqueteiam à mesma mesa e, a seguir, joga-se uma partida de xadrez. Alguém terá que ganhar. Há sempre alguém que ganha. É simplesmente o homem e o seu calcanhar de Aquiles, o poder.
A diplomacia começa já a tornar-se ornamental.
E nunca é demais pensar-se Nuremberga, o primeiro tribunal internacional da história.
Nico
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