terça-feira, dezembro 07, 2004
Before Sunset
Estava quase sózinho no cinema. Aliás, durante grande parte dos filmes promocionais fiquei a pensar que o projeccionista, admito, vi-a projeccionista, estava ali presa à minha noite, ligados pelo mesmo filme. Não há nada como uma pitada de romantismo antes de um filme cor-de-rosa. O filme mais uma vez era sobre a minha vida. Até era em Paris. Qualquer dia chateio-me deste projectar-me nos filmes que vejo e entro dentro da tela do cinema e de nunca mais de lá saio. Ao menos assim não me irrito por este constante rever-me. Estarei do lado de lá. O que eu sei é que o amor voltou a ser o grande tema da nossa vida. João Mota uma vez na Comuna, no Curso de Teatro, discutiamos a peça Louvor do Dia de Abel Neves, disse, o amor e a política estão sempre ligados. Nunca me esqueci. Há uns tempos dei conta de que esta frase tinha governado grande parte da minha vida amorosa. Eu que nunca fui especialmente politizado, que esperei pelos quarenta anos para a minha inscrição num partido político, fui reconstruindo em mim, sem o saber, o ideal de um companheirismo ao jeito de um Sartre e de uma Beauvoir. Outra vez Paris! Uma vez conheci uma mulher a quem jurei tudo o que um homem pode jurar a uma mulher. Nessa altura disse-lhe que lhe queria mostrar o disco da minha vida. Era o FMI do José Mário Branco. Não estava preparado para a reacção que se seguiu. Vejo-a muito incomodada a enfiar-se dentro do sofá, maldisposta, sem dizer nada, aguentando o disco de fio a pavio. Sim, é interessante, disse ela com a condescendência do amor enquanto eu percebia, silenciosamente, que tinhamos um alibi para não sermos nesta vida o par, a cara da coroa. Estou de qualquer modo em fase de reconstrução teórica sobre o, em mim, amor politico, que, confesso, não me fez mais feliz. Como naquela altura em que me apaixonei por uma mulher que tinha militado num desses partidos da rive gauche. Cheguei a pensar ter encontrado a minha Simone de Beauvoir. Durou um mês.
É mais do que oficial, estou em processo de refundação e revisão das minhas bases teóricas sobre o amor político. Não que me vá entregar àquele amor alienado, platónico e burguês da minha juventude, tanto da baixa, como da média como da alta. Alta, média e baixa juventude. Esta é uma subdivisão que é já em mim uma concessão àqueles, principalmente mulheres, que me acusam de ser uma eterna criança. Não sou. O meu congresso de revisão sobre os meus dogmas românticos vai mostrar que estou no pleno da minha modernidade propondo um novo olhar sobre a politica e sobre o amor.
Antes do anoitecer. Ou que anoiteça.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
6 comentários:
Antes do anoitecer! Um grande, enorme filme. Revi-me também ali, no escuro da sala de cinema, e só não chorei por estar demasiado envolvida com/dentro da conversa, dos personagens, das suas vidas, das suas histórias, dos seus sonhos. Fiquei mais uma vez com a clara sensação que tenho mesmo que ir a Paris. É incontornável! Para o ano tem que ser! Com ou sem O amor. Antes que anoiteça...
C'est ça!
Outro, também a atirar para o granjolas!
As incertezas acompanham-nos sempre e aprendemos a viver com elas.
É inelutável.
já começa a ser banal dizer q cada vez vou gostando mais do q aqui leio, identificando-me ainda por cima com algumas coisas. não deves levar isto à conta de elogio, tenho uma certa aversão à palavra, parece que sugere algo em troca e eu em troca só quero o prazer de continuar a ler coisas bonitas, vindas do fundo, parecendo vir do fundo da alma e dos seus imensos vazios, imensos planaltos vastos e desertos.
V.
Entro agora neste blogue e parece que tb estou lá dentro. Lembrei-me de muitas coisas enquanto te lia...
Do Woody Allen, é claro - que já entrou pela tela dentro. Da Hannan Arendt, é claro, que dizia que o amor é o mais anti-político dos "actos" humanos. Do Jacques Brel, é claro, que numa canção diz ser um homem que vai chegar a velho sem nunca ter sido adulto (sabes que as mulheres amam estes homens - mesmo que não saibam viver com eles - sim, fraco consolo!). De um namorado que tb elegera o FMI como o disco da sua vida - na altura era disco - e fiquei a pensar em como reagi na altura... e já não me lembro. De Paris, enquanto tb fantasiava sobre Sartre&Simone e anos mais tarde, quando lá vivi, e já não era a mesma... Respiramos uns pedaços do mesmo ar.
também foi em disco que o elegi, um 45 rotações, maxi-single. foi um ar respirável...
Enviar um comentário