sexta-feira, janeiro 14, 2005

O fenómeno Pedro Tochas

Antes de mais, a manifestação portuguesa do stand-up comedy é, na grande maioria dos casos e especialmente nos programas televisivos, uma pepineira, a que não consigo dar mais do que cinco minutos de atenção. Uma espécie de Rir é o melhor Remédio do saudoso Diário Popular, sem graça nem talento. Com anedotas requentadas. E eu sou daqueles que gosto do género. Vi ontem pela primeira vez um espectáculo do Pedro Tochas, um dos maiores cultores da stand-up comedy portuguesa. Ou seja, vi ontem das 23h30 às 2h00 o fenómeno Pedro Tochas.
Há uma diferença nele e é preciso conhecê-lo, à sua humildade, à sua ingenuidade para se perceber a razão do seu sucesso. Que não se explica apenas pela apetência do público por este tipo de espectáculos em que há a probalidade do espectador ser tomado de ponta e gozado do principio ao fim do espectáculo. Depois do experimentalismo dos anos 70 e 80 onde o espectador entrou por dentro do espectáculo, temos agora esta versão curiosa em que a integração do espectador se faz pela via do achincalhamento. Ontem um espectador mais idoso mandou uma boca. A partir daí a sua vida não mais foi a mesma. Ele foi continuadamente o velho, o incapaz, o impotente, o que já devia ter batido as botas. Não há que reclamar. As pessoas querem-no, pagam para o terem, esgotam os seus espectáculos antes dos bilhetes serem anunciados na comunicação social, logo que aqui são falados. Há algo curioso no fenómeno Tochas: o seu público feminino. Pedro Tochas, num misto de ironia e daquele auto-convencimento que, com simpatia, alardeia, diz que o seu contributo é o de fazer com que as pessoas vejam as coisas de uma forma mais descontraída. E creio que ele sabe o quanto isso é verdade em relação áquelas jovens que o acompanham de espectáculo em espectáculo e que arrastam consigo os seus namorados. Vi isso ontem e foi uma das pedras preciosas que trouxe deste espectáculo: raparigas a sairem da adolescência e a emanciparem-se através do riso, da forma como reagem às provocações de Tochas. Há, como em todos nós, uma circunstância e a de Tochas é a stand-up comedy. É por ela que ele poderá um dia tornar-se no criador que quer ser. E a libertar-se dos tiques, da anedotas, dessa brejeirice mal conseguida, do que tem sido a má concretização daquilo a que se tem chamado a stand-up comedy portuguesa. Uma coisa é certa, se Tochas o conseguir, porque ainda não o consegiu, diga-se, não ficarei surpreendido. O seu talento, preparação, inteligência, a forma como tem gerido a sua carreira, e até coragem politica, dizem-me que o fenómeno Tochas pode valer por si.

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