quinta-feira, fevereiro 17, 2005

Quando oiço falar de cultura...

Volto ainda ao texto de Rui Grácio. Quando ele diz que "pensava que sem a cultura não se fomenta a procura da elevação que está na base da nossa auto-estima, que nos devolve a ambição de sermos melhores, que nos permite rumar a uma identidade de orgulho", está a tocar num problema central da nossa sociedade. O mesmo com que hoje brinca Gonçalo M. Tavares "Quando nos exibem uma toupeira e se orgulham de esse animal tão eficaz estar do seu lado, a trabalhar em prole da causa política que defendem, devemos pensar se o que faz falta à nossa vida é um animal eficaz debaixo da terra ou acima dela. Como bem sabem os desprotegidos cadáveres em luta com os vermes rigorosos: nem toda a eficácia nos convém. " Quando se fala da sociedade da informação, do conhecimento, da tecnologia, e se tenta fazer com que isso seja paradigma de uma certa ideia - acrítica - de eficácia é preciso saber quem se reconhece nesta ideia chã de Rui Grácio: a da essencialidade da cultura na procura de uma humanidade desafiante da sua condição e presença neste mundo. Porque reconhecendo-a nessa centralidade, logo poderemos esperar que a imagem que temos dela não seja só o da ordem das modalidades, dos produtos, dos objectos, que tem o seu valor mas que no discurso político são extraodinariamente manipuláveis, mas no domínio da experiência e da vivência. Campo onde o homem não sendo irredutível à manipulação, é bem mais resistente. Porque, e vou citar novamente o comentário de R. Grácio "Foram os conceitos — essas entidades invisíveis ao olhar dos olhos — que nos arrancaram à violência e à lei do mais forte, proporcionando-nos a hipótese de coexistirmos num espaço argumentativo de comum entendimento. "

1 comentário:

Anónimo disse...

PORTUGAL FUTURISTA

"Os Bailados Russos em Lisboa"

Portuguez, atenção!
É a ti-próprio que nos dirigímos. Vimos propôr-te a tua liberdade! Escuta:
Conhecêmos-te tão bem. Não só pensamos em ti como até te estudamos quotidianamente.
Sabemos bem o extraordinario valor das tuas energias expontaneas mas tambem sabemos como as desperdiças inutilmente.
Quando gastas as noites no alcool ou no mal-estar d'essa tua ignorancia, ou n'essa horrivel hesitação da tua juventude bráva ha alguem que pensa em ti, alguem que trabalha para descobrir o methodo de te fazer independente, alguem que não acamaradando comtigo n'esse teu lyrismo natural e leigo, prometeu a si-proprio salvar-te. Esse alguem sômos Nôs!
(...)
A ti não te educaram, razão porque não existe em ti o sentido de consequencia e de dedução que facilitaríam o teu espirito para a disciplina das novas sensibilidades; porêm, OS BAILADOS RUSSOS dispensam-te de qualquer preparação litteraria ou artistica para comprehenderes facilmente a sua grande missão educativa, explicativa dos aspectos geraes e syntheticos dos sentimentos.

José de ALMADA-NEGREIROS
Poeta Futurista
Novembro 1917