quarta-feira, março 16, 2005

Primeira Noite

Quando amei pela primeira vez eu soube logo,pela janela do quarto, que o amor era como um campo de morte dos prazeres. Tinhamos ido ver as canções do António Botto na Casa da Comédia. Lembro-me das árvores circundantes à estrada que vinha do Palácio das Necessidades, da escuridão da noite e das luzes dos lampiões da rua. Devo ter pensado várias vezes ao longo da noite que caminhava para o paraíso na terra. Entre este carreiro com acácias, buganvílias e o seu quarto não me lembro de mais nada. Não me ocorre, para além daquele ar de miúda campo e cidade que lhe ficava tão bem, o que trazia vestido, o seu perfume, nem a cor dos seus olhos. Lembro-me de ela ter estendido o linho sobre a cama. A seguir estendemo-nos nós. Ela tinha alfazema no quarto. Um tom de nada. Da rua vinha luz, pelas frestas da janela. Eu tive que lhe dizer amo-te várias vezes e com várias sonoridades para conseguir ficar com o sexo teso, entumecido. De beijá-la como se lhe fosse comer a lingua, os lábios. Apetecia-me engoli-la, lembro-me. Tinha vinte e dois anos e nunca tinha feito amor com uma mulher. Já me tinha deitado com algumas mas não sabia ainda que estar dentro de uma mulher não era apenas uma metáfora. Como quando a desejamos de uma forma perfeitamente insuportável. Logo a seguir a ter entrado dentro dela descobri que só aí começava verdadeiramente o jogo. Ela pôs-me a mão na boca e sorrindo, estacou-me o frémito. Com candura, pediu-me que esperasse, que aguentasse mais um pouco. Olhei-a nos seus olhos tântricos e sosseguei. Eu não sabia nada do amor, não sabia nada sobre as mulheres. Excepto aquilo que aprendera nas revistas pornográficas. Sei que ainda não era Verão.