quarta-feira, abril 20, 2005

Aquilo em que não acreditamos

Há a tendência para se confundir uma coisa que deveria ser extraordinariamente simples de entender, caríssima Zazie. Ganhaste direito à Oração de Sapiência sobre a História do Cristianismo, mas observa: no nosso ateísmo, nós não nos excitamos com o que não acreditamos. Essa é aliás a grande confusão dos teólogos e dos discursos apologéticos sobre a Igreja Católica: confundem a crença nos dogmas da Igreja com a crença na Instituição. Para nós, os não crentes, que não acreditamos nos dogmas da Igreja, eles inexistem. José é um nome de homem e Maria é um nome de mulher e o Deus Menino é uma lenda que gostamos de contar aos nossos filhos porque sabemos que é uma história resplandecente. À Igreja Católica, seja a ICAR ou a coisa mais estúpida do mundo, como lhe chamou com mestria Caeiro, não a consideramos uma narrativa tão enternecedora. Não acreditamos nela mas sabemos, existe. Imagine-se o que seria o nosso gaúdio e satisfação se por não acreditarmos na Igreja, ela inexistisse. Não, existe. Mesmo sem nenhuma excitação, não confundimos desejo com a realidade.

5 comentários:

margarete disse...

faço minhas as tuas palavras JPN, e merecias que eu desenvolvesse um pouco mais, mas a maior parte daes vezes online fico preguiçosa para teclar as ideias

zazie disse...

Jpn,

Mas o que eu escrevi não se destinava aos não-crentes- destinava-se aos ateus militantes que são mais fanáticos e crentes que mil beatos!

O que tu dizes entendo eu bem. Eu própria nem me considero propriamente crente. Tenho uma noção de sagrado, gosto da Igreja Católica e nunca tive o menor trauma com isso tudo. De resto é tudo muito intermitente. Chego lá por via mais estética e ética que propriamente de fé. Sou um pocinho de contradições- muita fantasia para umas coisas mas demasiado racionalismo para levitar com causas ou êxtases que não sejam mais terrenos.

Se queres que simplifique digo-te que quando pressinto cruzadas dá-me para ser extremista. E é verdade que pressinto uma cruzada ateia, imbecil e bacoca adaptada a uma esquerda que envergonha. Se quiseres lê o Dragão que disse as coisas com as letras todas.

http://dragoscopio.blogspot.com/2005/04/vo-chamar-papa-outro.html

E, como é óbvio o nosso amigo Luís não vem ao caso. Mas algumas coisas linkadas e referidas e embevecidas até vêem...

zazie disse...

mas digo-te mais: mesmo que para mim Maria ou José fosse apenas um nome, o que nunca faria seria separar esse sentimento do património histórico edificado à custa daqueles para quem não é apenas um nome.

E aí é que está a diferença entre o que diz respeito ao individual e o que diz respeito ao colectivo.
E eu sou uma intransigente defensora da história, do património da humanidade e das raízes dos povos.
Não sou liberal nem digo como o JM (com quem me entendo bem em debates abstractos) que os povos não existem porque apenas existem cidadãos.
Não, é falso. Os povos existem, a história também e nós individualmente não somos ninguém para estabelecer parâmetros desse legado.
E depois há outros factores que sempre me incomodaram: um deles chama-se inveja e apropriação de mensagens. E a esquerda ficou biursa com esta nomeação porque na volta, por muito que o neguem, vivem de se agarrarem à tradição social da igreja e sabem muito bem que é ela a única que preserva essa missão de cuidar dos fracos e desfavorecidos.
E agora que já não lhe conseguem usurpar o lugar como nos tempos do comunismo danam-se por não terem bênção papal para as suas caricaturas.

zazie disse...

erro: vêm.

JPN disse...

Olha Zazie, fui bem mandado, fui ver a tal baforada do Dragão. E olha, prefiro ler-te pelas tuas ideias. dispenso-me a comentar a incontinência verbal. é que ao fim de dois segundos a inteligência que poderia ali parecer conter-se já perdeu o prazo de validade.