domingo, maio 01, 2005
Ser ou não ser ou não ser muito
Coincidência. Concomitância acidental de dois ou mais fenómenos (de co+incidência). Incidência vem do particípio presente latino incidère, que significa cair em, acontecer, suceder por acaso. Pois dois acontecimentos que sucedem por acaso, simultaneamente, darão leitura ao resultado da conjugação desses dois fenómenos? Se sim não se acredita na coincidência. Não estou a fazer publicidade a nenhum best-seller.
Tive um professor de filosofia que pediu para multiplicarmos os óvulos das nossas mães pelos espermatozóides dos nossos pais e calcularmos a nossa probabilidade. Depois calcularíamos a de cada progenitor, multiplicando pela probabilidade individual. E assim por diante até ao início dos tempos. Sentiríamos desta maneira a vertigem única de cada vida, desta única vivida dentro de uma pele. As mãos, as impressões digitais, nós lotaria genética, nós neste lugar em que outras expressões genéticas se poderiam exibir. Nós resultados de timinas guaninas adeninas citosinas a disporem-se como num jogo infantil, definem a cor dos olhos, o formato dos olhos, se são espelhos da alma como disseram estetas entusiastas, as aleatoridade das bases azotadas condiciona a alma.
Não crer em coincidências, deixarmo-nos levar por um teve de ser assim, foi porque sim, não necessariamente nos torna amorfos. Mais felizes e conformados um pouco, sim.
Tenho compaixão, de latim compassiòne, sofrimento comum, por quem não crê um pouco no rumo das suas histórias pessoais, pois às vezes o vivo. Também tenho compaixão por quem crê cegamente que cada passo que dá foi determinação universal.
Não crer em coincidências é dar alguma importância e cor. Fantasia, terreno do incerto. Como uma marionete que tem a sua história escrita, garantida e uma mão que a anima. Não crer em coincidências é o vento a favor da direcção que tomamos, vento por entre os cabelos num dia de tempestade, dispensando tanta força para chegar onde se pretende.
Crer é ser existencialista, anti-casualístico, um peso incomportável para indivíduos frágeis.
A permanência a meio caminho entre a crença e a descrença é contraditório, que é parecido com o balançar entre uma e outra posição.
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2 comentários:
Cada um de nós fixa-se em pedaços diferentes de um mesmo diálogo. Eu, fixei-me no filósofo. Lembrei-me de um livro que li há já alguns anos, The Ovary of Eve, da Clara Pinto Correia. Esse livro nasce dum encontro feito leitura de outro livro, do Prof. Celestino da Costa, que dizia que um ovista chamado Haller tinha calculado quantas pessoas Deus tinha encaixado dentro do ovário de Eva, acabando por concluir que eram 200 mil milhões de pessoas.
Pelas palavras da própria, na altura em que foi publicada a versão portuguesa do livro "O livro é sobre um debate de ideias, e ideias com ramificações tremendas (sociológicas, religiosas, mitológicas, folclóricas, herméticas e cognitivas, pelo menos). (...)Espero que também revele ao leitor algo que eu pessoalmente acho muito importante: como um tema aparentemente circunscrito no espaço, no tempo e na disciplina é, na realidade, um tema que não pode ser discutido se não trouxermos para a mesa um leque enorme de componentes que à partida nem sonharíamos que podiam lá estar, de Deus à menstruação, da música das esferas à masturbação. Ou seja, parafraseando Paracelso, é uma excelente demonstração de como «o todo está escondido em tudo». (...)
As explicações e a forma como cada um de nós vê a sua própria vida, seja com ou sem coincidências, não a torna, a meu ver, mais fácil.
Diferente, talvez.
Se acredito, ou não, num destino: não sou por isso mais feliz.
Vejo as coisas de outra forma e conduzo a vida por outros caminhos.
Mas quem conduz realmente, plenamente, toda a sua vida?
Que mistérios nos ultrapassam, e não falo em Deus, mas em nós mesmos, que não nos permitem abarcar toda a realidade?
E o que é a realidade?
Com ou sem Deus, com ou sem destino, julgo que o Homem se perguntará sempre qual a razão do seu ser.
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