quarta-feira, maio 11, 2005
Voltar a casa é o maior exercício do contrário de liberdade
O maior exercício de liberdade de que já fui capaz foi o sair de casa sem destino e acabar por construir um.
O poderoso desconforto pleno que não é atmosférico de estarmos numa estação de comboios, a olhar para as junções do metal das linhas com o objectivo bem demarcado de não se apanhar um comboio.
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4 comentários:
Não ter destino é bom se bem que às vezes pode ser mau. Andar à deriva indefinidamente é mau.
A coisa que mais gosto quando saio de casa é voltar a casa. Sou bastante caseiro, confesso. Talvez seja o dia-a-dia que me faça ser assim. A rotina faz-me ser assim. Lembro-me em tempos que gostava de andar a deambular sem destino e em que saía de casa sem querer voltar ou sem ter a pressa de voltar. Esses foram os melhores tempos. Depois, depois habituei-me à nova rotina e à nova forma de viver o meu dia-a-dia. Vivendo ansiosamente que ele acabe e que me traga de novo ao meu local de regeneração.
Pode ser que ele mais uma vez mude. Todos nós de uma forma ou outra queremos todos que as nossas vidas mudem. Uns conseguem, outros não. O tempo dirá se sim ou não. Nunca poderemos ser totalmente iguais aos outros e diferentes dos outros. Somos nós mesmos e há que encarar isso com alguma pacificidade.
Mas acho que fazes tu muito bem em te deixares ir. Quem sabe se um dia desses, uma viagem perdida com falta de destino não te traz algo de bom. Algo muito bom com que não esperavas. No desconhecido, às vezes encontramos coisas inesperadas que nos fazem sentir bem.
As sultanas do Ernesto, a fita da Lurdes, os fados da Maria, as vinhas da Rosa, o Olá do Rodrigo e a vida e a morte da Esperança são o melhor que podes ter na vida. Já viste o que é aprenderes algo de novo todos os dias ao longo da tua vida? Já viste o manancial de vidas com que vais lidar? Nem sempre vai haver histórias alegres e felizes para recordar, sim, sem dúvida. Mas poderás dizer que todos os dias aprendes lições de vida e que poderás ter sempre uma perspectiva das coisas muito diferente da maioria das pessoas com que lidas fora da tua rotina. Ter algo a dizer, outra perspectiva a mostrar aos outros é algo muito bom.
Acredito veemente que conseguirás lidar bem com o teu dia-a-dia. Só é preciso ter calma e respirar fundo no dia-a-dia, ao longo do dia, durante a tua vida.
*
Olha, ainda agora cheguei e não estou certa do que quero e posso dizer...
Talvez um dia possas voltar para casa a correr, porque, de repente, te lembraste que te tinhas esquecido de regar aquela flor.
Acho os bancos da estação frios e pouco confortáveis.
Estavas sentado?
Sei que há prisões imensas, algures numa memória de medo.
Mas gosto do som que os comboios fazem...
Muito engraçado.
Nem sei bem por onde começar, talvez por aquilo que sentimos.
Já mudei de cidade algumas vezes, e ainda hoje me sinto tremendamente atraído com essa sensação de chegar a um lugar que funciona como uma folha em branco, onde podemos escrever tudo de novo. È emocionante, é provocador, causa medos, e dá....uma enorme sensação de liberdade.
Esta hipótese de nos reconstruirmos é incrível!
O maior desafio é talvez construir essa liberdade na nossa própria casa!
Depois de ler o comentário acho que isto nã ficou muito claro, mas pronto......
:) Sim a casa sabe muito bem. Às vezes, quando está frio, no silêncio. Um livro sabe melhor sem horas, enterrados no sofá. Música durante as limpezas. Dormir dormir. A nossa almofada está na nossa cama, na nossa casa.
As nossas fotografias na parede. Os livros na estante. Nós por todo o lado.
:) Sim, segui o conselho de respirar fundo, tem funcionado. Não desisto. Mas ser enfermeira é carregar muitas vidas. E se não conseguir levar uma imagem comigo de cada vida, aí deixo de o ser, prometo.
:)Os bancos das estações são frios, mas as imagens são cinematográficas. Vale mesmo a pena uma estação de comboios: o som a textura as pessoas os pés o cheiro o cheiro o cheiro.
É por isso que os viandantes gostam de estações de comboio?
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