domingo, agosto 28, 2005
Oitenta anos abertos
Ontem, ao tomar o pequeno almoço ao balcão de uma pastelaria do bairro, surpreendi-me a escutar uma conversa. À minha frente, no outro lado do balcão em v, uma gaiata, soube depois, jovem nos seus oitenta e um anos e um dia. Bonita, muito bonita. Não costumo ousar-me em galanteios mas neste caso atrevi-me. Ela estava a confessar ao empregado - e hão-de reparar que estas pastelarias do bairro estão dispostas para poderem ser uma espécie de confessionários compartilhados - que tinha sempre tido uma grande ansiedade por fazer os seus oitenta anos mas que agora, achava banal. Agora já tenho mais um dia,
disse, como se tivesse durante muito tempo alimentado o sonho e a esperança de nascer de novo aos oitenta anos.
Secundei o empregado, dizendo-lhe que parecia ter sessenta anos. Aquele senhor estava a ouvir a nossa conversa, não estava, disse ela para o empregado, estranhando o meu reparo. Sorri, acabrunhado. Paguei-lhe o carioca de café a medo, tive de falar baixinho ao empregado, apeteceu-me mas tinha receio, podia ser mal interpretado, sai à pressa, envergonhado, como dizer-lhe que rejubilo ao ver assim a vida, forte, sã, corajosa.
Eu sei, parece não ter nada a ver. Mas tem. Hoje ao ler o texto de Carlos Ventura Martins no DN sobre a candidatura de Mário Soares, apercebi-me da grandeza maior deste homem que parece ter nascido para servir a República e que nisso encontra uma resistência para uma longevidade política incomum.
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3 comentários:
O que escreveste, foi uma das poucas opiniões positivas que li sobre a posição do Mário Soares nesta candidatura...
Concordo em absoluto com o teu comentário. São sempre os mesmos e esses não estão melhores. Há uma espécie de masoquismo nacional e sobretudo falta de imaginação. Afinal somos ou não um país de poetas? Quando se trata de dar a cara vimos com o pseudo intectualismo e pomos os de sempre no poder.Há falta de melhor...
jota, deu-te a ternura dos quarenta! que lindo... :)
agora a sério: jota, deu-te a dor de barriga pré-eleitoral. a quem entregaremos isto quando tudo arde?
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