terça-feira, dezembro 20, 2005

Quando um homem chora

Tem cinquenta anos. Chama-se Joaquim como eu. E embora se desenrasque bem em tudo, pôr uma sanita, um lavatório, abrir um roço, é pintor. É o meu ofício, com cinquenta anos não tenho outro modo de pensar organizar a minha vida. Hoje vim com tempo, com aquele tempo interior que nos deixa plasmar nos lugares, ouvi-o. Esteve-me a falar de coisas simples. De como é brioso no seu trabalho. O seu modo de fazer. Antes de pintar há que esfoliar, raspar, tapar, preparar. Eu ouço-o com todo o tempo do mundo. É um biscateiro, este Joaquim. Tem uma filha de quase vinte anos que criou quase sózinho, com ajuda de uma madrinha. Não teve muita sorte com as mulheres, diz. Em tudo. A última deixou-o com uma mão atrás e outra à frente. Fala-me de pincéis, de trinchas, do brio e depois começa a emocionar-se. Pára. Quase chora. Não ligo. É claro que me impressiona ver um tipo simples como ele a chorar por que aos cinquenta anos precisa daquilo que andamos todos muito necessitados: sermos estimados, reconhecidos.

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