terça-feira, abril 11, 2006

A imortalidade dos outros

Falar da morte é como falar da chuva que não veio, ou que não veio ainda. É como contar, recontar, citar imbondeiros. Criar galinhas, patos, pintaínhos. Florestar o mundo, erguer uma reserva natural na Patagónia, na Colômbia ou até, no teu quintal. Cada um fala da morte como pode. Ou como não pode. A recusa em falar da morte é um poderoso discurso sobre a morte. Falar sobre a morte é falar da vida. Não se prevê também que seja possível, em vida, viver, sem isso ser um discurso sobre a morte. E pode-se perguntar, não se fala demasiado sobre a morte? Eu creio que não. Pela vida que conheço, o que deprime o mundo, ou seja, o que agasta a vida das pessoas, são as pequeninas imortalidades alheias. A obsessão pela imortalidade é a mãe da morte do nosso mundo. É aí que nascem os cabrestos, os filhos da mãe. Os ávidos. Os impositores. Quando vires um imortal empunha a espada ou a adaga e corta-lhe a cabeça rente. O mundo respirará um pouco melhor.

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