segunda-feira, abril 24, 2006

Um tsunami

"Quando vi o tsunami na televisão pensei: isto é o meu marido. Um mar calmo, sereno, e de repente... a destruição total." Parece quase pueril esta imagem. Agora pense-se numa mulher. A ver televisão. As imagens do tsunami. A buscar compreensão em tudo o que se mexe há sua volta para tentar entender aquele demónio que dorme com ela há mais de trinta anos. Faça-se as contas, como dizia o outro. Trinta anos vezes trezentos e sessenta e cinco dias. Seis nos anos bissexto. Vezes vinte e quatro horas. Vinte e quatro porque ninguém acredita que o sono lhe dê tréguas. Só a morte. A mesma morte que desejaria à filha se ela tivesse a mesma sorte. O mesmo azar. Vezes 60 minutos. E segundos. Porque quando se sofre vive-se ao milésimo de segundo. Um sufoco. E agora, depois de contas feitas e refeitas, volte-se a olhar para esta mulher. Trinta anos depois, sentada numa cadeira a olhar uma televisão. Olha as imagens do tsunami. Olha-o na sua devastação mas também, na sua perturbante beleza. E de quem se lembra?

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