Fim da manhã de dia de semana. Snack-bar na Morais Sarmento, à pinha de gente em busca de um almoço que se pudesse engolir sem mastigar.
Eu e S. sentámo-nos numa mesa, alheados do ritmo geral. Folheava uma revista com vagar de fim-de-semana, e parei num artigo que discorria sobre o mistério dos chineses imortais. Quer dizer, não é que o povo de tão longínquas paragens tenha descoberto algum elixir. O mistério que não sendo mistério se esclareceu, depois de perceber que os seus mortos são devolvidos à terra, sem que seja declarado o óbito às autoridades nacionais. Por isso, para todos os efeitos oficiais, os chineses além de máquinas de trabalho, não morrem.
"Queres ouvir esta? A cultura de luto dos chineses dita que não podem chorar a morte de crianças, nem os próprios pais lhes podem dedicar orações."
E é então que uma senhora até ali silenciosa, sentada sozinha numa mesa entre a nossa e a parede, comenta descuidadamente para o ar como quem pensa com o volume elevado:
"Eu não dava para ser chinesa. Todos os dias, quando a noite chega, choro... Depois passa. Acho que sou sensível. É...Devo ser sensível. Deve ser isso. A razão por que tenho essa vontade de me deixar ir.".
Ainda olhei incrédula, mas chegou outra senhora que se lhe juntou e desataram a falar, com entusiasmo, de moldes de costura.
O S. ou fingiu que não ouviu ou estava demasiado concentrado sopa de lombardo.
A máquina expresso assobiava e alguém pediu um café em chávena grande.
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