sexta-feira, setembro 15, 2006
Bodas de Fígaro
Durante uns dois meses há o lento armar da cena. É como um campo destinado à fertilidade, um teatro. Vem em peças separadas para montar. Primeiro os actores e o piano, o palco nu. Depois o forte dispositivo cénico. As luzes. Adivinho o cheiro de uma estreia aqui no Teatro quando vejo chegar as máquinas da limpeza dos veludos e das carpetes. É a partir daí que eu começo a perceber em cada um dos sectores, aquele ligeiro nervo e agitação dos momentos que rapidamente se aproximam. Ontem as costureiras foram-se embora. Voltarão depois - já não em magotes, para algum arranjo e conservação - mas aquele fervilhar a que já me tinha acostumado não voltará tão cedo. A efervescência agora vai para os telefones da bilheteira, do secretariado, do protocolo. As estreias são lugares sociais. Ocasião para encher de vozes o Salão Nobre, de consultar as estrelas e o glamour. Entretanto o palco voltou à sua obscuridade, há uma espécie de liturgia que todos nós tendemos a respeitar. E daqui a pouco a grande explosão de energia, de adrenalina. Enquanto desço para sair cruzo-me com actores, com a encenadora, técnicos. O clássico muita merda anda ali como moeda de troca dos afectos. O teatro é um território de afectos. E essa condição que por vezes é tramada, é também o espaço da sua resolução.
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2 comentários:
Como deve calcular, também nós vivemos em campos cénicos onde a fertilidade teatral é menos pródiga.
Por isso, a agitação própria de quem gosta de representar, embaraça as estrelas que vivem entre os muros deste Palacete.
Mesmo assim, em menor escala, sabemos das emoções e fazemos como que estivessemos no Bolshoi.
Os nossos cumprimentos.
As bodas de fígaro (as tais do glamour) renderam-ne um euro (atenção: um euro!) de gorjeta. Esperamos menos glamour e mais moedas.
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