quarta-feira, fevereiro 14, 2007
Double mind
Hás-de reparar: exorcizamos os nossos mortos através da fala, do discurso. Temos que falar neles até a voz se desfazer em grão e o grão em ar. Poderia ser de outro modo: cavaríamos um buraco tão fundo que tivesse o mesmo efeito-alçapão que emprestamos ao linguarejar, mas não tardaria não viveríamos numa cidade, sim num enorme queijo suiço. E ainda mais: com aqueles que comungam dos nossos mortos, a empatia é tão profunda que as mais das vezes só já lá vai com silêncios. Precisamos por isso de falar e temos que o fazer com aqueles que nos têm como os seus vivos. O problema é que quando o fazemos ouvimos o inevitável, vá, tira a mão do queixo, o que lá vai, lá vai. E então, enquanto morrem os nossos vivos, os nossos mortos perduram-se em vida.
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4 comentários:
Creio que percebo o que dizes. às vezes parece que a minha própria doença e morte se afastam de mim quanto mais as partilho com os meus.
'só já lá vai com silêncios', Joaquim... o que eu compreendi esta frase... só já lá vai com silêncios...
Essa é a 1ª fase do luto, falarmos deles/neles com aqueles q os partilharam connosco. A 2ª é falarmos não 'neles' ou 'deles' mas com eles, directamente. Já tentaste? :)
Dizer o teu nome baixinho, baixinho... Estelinha, Estelinha, Estelinha... na esperança de que um dia se gaste e se apague da memória...
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