Mohammed, 40 anos, e Ghulam, 11 anos. A primeira vez que vi a foto num jornal gratuito impressionou-me muito. Quase que me zanguei. Tinha na ponta da língua uma data de gritos convenientes. Agora fico a olhar. Olhos nos olhos com Mohammed. O olhar fugidio de Ghulam. Resisto a olhá-los pela nesga aberta pelo meu pequeno mundo. Tento até descobrir-lhes a possível altivez. A nobreza da existência. A determinação. A foto esconde muita coisa. Fica como uma proposta aqui para o comentário. Falem desta foto, do que aqui vêem.
8 comentários:
Marido: "E depois, nunca viram?"
Esposa: "Como é que eu fujo deste gajo?"
Globally, the number of child brides is hard to tabulate; they live mostly in places where births, deaths and the human milestones in between go unrecorded. But there are estimates. About 1 in 7 girls in the developing world (excluding China) gets married before her 15th birthday, according to analyses done by the Population Council, an international research group.
In the huge Indian states of Rajasthan and Uttar Pradesh, the proportion is 36 percent; in Bangladesh, 37 percent; in northwest Nigeria, 48 percent; in the Amhara region of Ethiopia, 50 percent. Tens of millions of girls are having babies before their bodies are mature enough, increasing the likelihood of death from hemorrhaging, obstructed labor and other complications.
(in http://www.nytimes.com/2006/07/09/magazine/09BRI.html?_r=1&oref=slogin)
mesmo retirando 10%-20% às estimativas, o resultado é assustador.
a foto apenas me faz lembrar que há monstros, reais, e um mundo inteiro de crianças que sofrem enquanto nos divertimos a tentar descobrir "sentidos" e "olhares alternativos".
não tenho mesmo outra leitura para esta (e outras, cf. art. NYT)
vê-se apenas pobreza (de tudo) e uma menina que já não vai ser professora.
provavelmente morreu/irá morrer no parto...
talvez devesse essa foto ser mostrada para olhar a nobreza, a determinação, a não-ocidental-socio-centricidade.
não gostei.
se quiseres usar a imaginação, tenta ouvir um choro... depois passa e o ser humano habitua-se e resigna-se
nerd, não sejas injusto.
a injustiça só aparentemente te torna mais justo do que os outros, neste caso eu: não há nada, no longo olhar que mantenho com esta foto, que seja diversão.
tudo o que tu escreveste, claro que já o sabia. a minha quase zanga tinha a ver com isso, sabes bem.
aquilo que tu não escreveste e aquilo que também não escrevi, é aquilo que eu não sei.
mas que pressuponho: que independentemente do azimute, do meridiano, da cultura, há, no ser humano uma dignidade, uma altivez e uma determinação para o bem estar e para a harmonia que são os possíveis traços de estabelecimento de uma linguagem comum entre os humanos.
quanto aos monstros, cada um inventa aqueles que mais os sossegam (é curioso isto não é, os nossos sonhos serem encomendas para a nossa melhor tranquilidade?!).
claro que eu também vejo as mesmas coisas que tu vês nessa foto. com uma diferença. admito que haja mais maneiras de ver esta realidade. e que possam ser mais luminosas do que a minha e a tua demagogia.
não te iludas. somos ambos sensíveis, somos ambos inteligentes e somos ambos atentos ao mundo que nos rodeia. por isso somos amigos embora tenhamos estas pequenas divergências. tu não consegues sair para o intervalo de um espectáculo do Lepage sem estares logo a botar opiniºao sobre o mesmo, e também não consegues olhar esta foto que apela à nossa maior revolta, sem fazeres um longo exercício de demagogia.
o problema da demagogia não é quando ela é dita de forma inconsequente por mim ou por ti. é quando ela passa à fase da violência. porque os monstros não são só aqueles que nos assustam até ficarmos tranquilos. são também aqueles que nos levam à guerra, à imposição, ao limite da violência e do ódio.
de qualquer forma, vamos deixar seguir a dança?
abraço, nerd, até amanhã
relendo, não retiro nada da revolta que senti no que está na foto.
tenho monstros não negociáveis.
não me sossega nada ver os monstros que retiram qualquer hipótese a uma criança.
não me sossega nada saber, embora amanhã já o esqueça, que há um choro pequenino, que nunca teve o raio de uma nesga de esperança e a impotência para uma situação destas. por cá também há disto, com outros graus...
não consigo salvar o mundo, não o pretendo, por isso rejeito o epiteto de "demagogo".
irrita-me também saber que depois do choro, vem a repressão, de um e de outro lado, e a habituação e, se sobreviverem, seres humanos que o não podem ser.
como se disse "para os homens que nunca puderam ser meninos" - é essa perda irreparável que vejo na foto.
como qualquer analista diria "at the end of the day"... o que está naquela foto não tem altivez, nem nobreza nem nada, apenas miséria, humana.
PS : o "...nos divertimos a tentar descobrir "sentidos" e "olhares alternativos"..." sim! é demagogo e parvo, concedo. isso é fruto do meu "estado de ódio".
até amanhã camarada. :)
Querido Joaquim,
eu não consigo falar desta foto, tenho a voz tolhida pela comoção que ela me provoca cá bem no fundo das minhas entranhas. Abraços
eu vejo um mundo como era o meu não há muitas gerações. nós vimos disto, também. o nosso mundo também se fez sobre coisas assim, agora impensáveis.
quantas das nossas avós casaram com 14, 15 anos? muitas.
e bisavós? quase todas.
umas tiveram famílias felizes, outras não.
umas casaram com homens bons, outras não.
o que não sabemos é o que nos dá essperança.
o que sabemos é o que nos entristece, de facto. porque aos 14 anos há ainda tanto por descobrir...
é uma menina que se chama Ghulam e tem 11 (onze) anos.
o que é que há para dizer? "a foto esconde muita coisa." ah! pois esconde! e é bom que consigamos descortinar aquilo que esconde. para que meninas de 11(Onze)anos possam ir à escola, brincar, tentar ser felizes e acima de tudo terem oportunidade de crescer!
p.s.: tentei ler alguma coisa nos olhos do Mohammed e... naã! não vi nada...nada de nada!
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