Acabo de ver Berlin do Gonçalo M. Tavares na Comuna - Teatro de Pesquisa. Tinha antes visto do mesmo autor a Colher de Samuel Becket, numa encenação de Álvaro Correia. Eu creio que esta encenação amadureceu e intensificou a relação com alguns dispositivos narrativos na escrita do Gonçalo que têm grande potencialidade teatral. Como o recurso à narração, às vozes descontextualizadas. As coisas, e quando digo coisas digo discursos, discursos sobre as coisas do corpo. Lemos um texto do Gonçalo e de repente irrompem naturalmente vozes, movimentos e às vezes parece que há até uma estranha fixação neles, nesses movimentos. Outros que se nos apresentam de uma forma orgânica. Os resíduos do corpo. Em Jerusalém há uma personagem que procura desesperadamente uma parede para urinar. E nós acompanhamo-la nessa obsessão.Aqui a mulher redunda na ideia de mijar. Não conheço o que é texto e o que é encenação mas assinalo este ir a Berlin para falar de anjos ou de sombras que carregamos como demónios, pequenos anjos pálidos como um ganho conjunto do material textual e cénico. Saio do espectáculo com uma ideia que arranquei da atitude dos actores: há uma razão e um porquê neste trabalho que é raro encontrar e isso tem a ver com este esforço de falarmos sobre nós e no aprofundar da relação entre texto e cena.
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