Acabei de assinar a petição dos cidadãos pela laicidade . Compreendo o júbilo dos cristãos e católicos com a presença do Papa em Portugal, e certamente que, intimamente, lhe desejo as boas vindas e fico contente por Bento XVI estar entre nós. E também me parece que neste pensar-pronto-a-usar para que muitos nos tentam atirar, as questões mais importantes não são os custos da tolerância de ponto. A questão principal é que, como bem refere a petição, Bento XVI é o chefe de um pequeno estado teocrático no coração da Europa - cujo comportamento nas instâncias internacionais como a ONU desconhecia ser tão lamentável - e o expoente máximo de uma confissão religiosa que, naturalmente - como outros líderes de confissões religiosas - lidera um reino que não é deste mundo finito e material em que vivemos. Ainda há pouco tive de sair do pé da televisão pública. Foi a minha mulher que reparou. Estava com os olhos meio vítreos e catatónicos, a face enrubescida, as mãos trementes, com sinais de intoxicação ideológica acentuados. Bento XVI suspendeu a condição de prós e contras deste imenso ágora da RTP. Todos ali eram a favor. Como se anunciassem, mas pode lá ser-se contra Bento XVI?! Pode, claro que pode. Pode, e em muitos casos deve ser-se, contra aquilo que ele e a sua Igreja representam. O silêncio face aos crimes da pedofilia é apenas a expressão mais recente de uma Igreja que lida mal com o corpo, com a festa da vida e da sexualidade. As posições da Igreja sobre a homossexualidade, sobre a utilização de meios contraceptivos, sobre o papel das mulheres na Igreja, merecem um debate profundo numa sociedade laica e se a Fátima Campos Ferreira fosse a grande jornalista que quer ser tinha-os convidado para o programa. A certa altura disse que ao ler as encíclicas papais tinha ficado supreendida com a forma como Bento XVI utilizava o debate para procurar a solidez do pensamento. Deveria também ela inspirar-se nisso e trazer ao debate a expressão do religioso e do laico. Em vez de parecer moderna dizendo que a visita do papa pode ser acompanhada no facebook, poderia dar-nos conta das brincadeiras facebookiana (será que ainda existe humor) do Miguel Castro Caldas e do Rui Rebelo ou as performances dos promotores do Apupópapa. Ou trazer os representantes do Palco Oriental no Beato, em vésperas de serem despejados pelo Patriarcado de Lisboa depois da acção judicial que esta ganhou. Basta de falar sobre as tradições católicas dos portugueses para justificar o atropelo da mais elementar regra republicana: vivemos num estado laico.
Também não deveria a Igreja aceitar como natural, e ser cúmplice, deste abuso de recursos e silêncios públicos.
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