Está uma noite memorável de Verão, ali, em Sintra. Passámos a tarde na praia das maçãs, tínhamos aflorado à praia grande mas a bandeira vermelha e uma língua diminuta de areia fez-nos dar a volta, a das maçãs deve estar amarela, calculamos, estava, banho de espuma, de areia, enrodilhados nas ondas, mas lá para o fim da tarde havíamos de nos vingar todos, dando voos sobre a água, como se fossemos peixes. Agora, já jantámos, cá fora, o tempo ameno ainda, manga curta, conversamos sobre os astros, sobre a ciência, sobre o que sabemos, sobre o que não sabemos. Ele tem cerca de dezasseis anos e nós os quatro, estamos todos nos fins dos quarenta. É um positivista, Comte haveria de gostar de o ouvir, na sua veemência contra a metafísica ou o que está para lá dos fenómenos. Diz que todas as metafísicas, todo o conhecimento não científico é ridículo, pede, de peito aberto, provem-me, provem-me. É difícil não acreditar na juventude assim, penso. Até que lhe digo, tenho uma má notícia para ti R., não é quando todo este conhecimento te conseguir provar que é válido que tu o vais aceitar, é quando descobrires que a ciência não te fornece todas as respostas, quando descobrires que ela pode ser tão ridícula como todas as outras formas de conhecer. E depois fiquei a pensar nisso, na verdade que para mim isso é. Sou o mais céptico dos homens. E quanto mais céptico sou, mais aceito que todos os mundos são possíveis. Todos. O meu agnosticismo tomou conta de todo o meu pensamento, tanto o físico como o metafísico. A única coisa em que acredito é nisto. Numa noite de conversa, num jovem de peito aberto cheio de bravata contra os ridículos do mundo.
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