terça-feira, julho 15, 2003
Ainda a Esquerda e a Direita...
Ou não. Talvez seja só entre a verdade e a mentira.
Fiquei chocado quando o Vital Moreira escreveu hoje que "estamos agora em condições de saber que, quando Bagdad denunciava como mentiras as alegações de Washington relativas às armas de destruição maciça, era do lado iraquiano que estava a verdade".
Claro que também a mim me apetecia zurzir o pau de marmeleiro sobre todos os fabricantes desta monstruosa mentira mas não posso. A menos que glopeie o ar como um Quixote sem dom nem Sancho Pança.
Por isso estou contra Vital Moreira.
Ele não tinha o direito de escrever isto.
O regime de Saddam Hussein é uma ditadura e "as democracias ocidentais" são, passe o pleonasmo, democracias. Não é concebível que um democrata, e Vital Moreira é um dos nossos mais brilhantes democratas, venha escolher, sobre que pretexto for, a barricada da defesa das ditaduras (e não me venham com essa de que a Babilónia é o berço do Mundo, também do nosso, também nós já tivemos Cruzadas e Inquisição e isso não nos impediu de hoje sermos "o berço das novas democracias").
Já basta que tenhamos de conviver com a vergonha de que as nossas "democracias" sejam tão pouco verdadeiras democracias e ainda menos nossas. Agora dizê-lo, proferi-lo, e culpa maior ainda para o Público que se aproveitou do facto de José Manuel Fernandes estar enfiado em caixotes e caixotes com as provas daquilo que não existiu para meter em caixa alta este excerto do texto de Vital Moreira.
Há uma coisa que é preciso dizer de uma vez por todas a esta intelectualidade rasca que nunca soube apreciar o laborioso trabalho dos sabujos: é preciso perceber que é muito mais rigoroso, muito mais dificil montar o ardil do que dizer a verdade. Falsas ou não as provas do comprometimento do Iraque custaram muito mais aos bolsos dos contribuintes do que a verdade. E não respeitar este persistente trabalho de montagem, principalmente porque altamente arriscado, já que nunca souberam os seus promotores se alguma vez iríamos acreditar nas suas patranhas, parece um exercício de uma indisfarçável arrogância.
Mais do que isso, e talvez esse seja o maior pecado de Vital Moreira: não perceber que, se estava em causa uma guerra entre o Iraque e a Civilização Ocidental é da maior abnegação democrática prestar-se ao trabalho menos limpo de fabricar o embuste, única e altruísticamente para que nós, povo, cidadãos, pudéssemos continuar a acordar todos os dias do lado certo da verdade e da vida.
Aliás não sei porque é que num país onde já se condecoraram Pides, os bravos cidadãos que colaboraram intelectualmente nesse encobrimento como Durão Barroso, Luís Delgado, José Manuel Fernandes, António Ribeiro Ferreira, entre outra escuderia menor, não foram ainda propostos para receberem as mais altas insígnias da República Portuguesa.
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