quarta-feira, outubro 15, 2003

Página Impar

tento ao limite esquecer-me de quem sou para desenrolar esta entrada. demorei alguns dias a escrevê-la, para que isso em mim fosse mais verdadeiro e não mero exercício retórico. mantenho o jornal em cima da secretária, tentando descobrir outros promenores que me ilibem desta natural impulsão para o comentário. não que queira manter este respirar imune à política. aprendi-o aos dezanove anos, numa sala de trabalho de um casarão cor-de rosa, a respiração é o primeiro acto politico da humana condição . foi na segunda feira, uma página impar do "Público", dedicada à politica nacional. quatro objectos, poderia, não o faço, chamá-los de arremesso: uma notícia sobre as declarações de ana gomes numa reunião partidária, uma réplica de josé lamego a um destrambelho (no mínimo) da mesma ana gomes, uma critica da juventude popular à actuação do PS, e, num filete à esquerda, excitações de Pacheco versus Marcelo ( reforçando a ideia perversa de que a diferença de estilos entre os dois, fazendo entrar aquele antagonismo que surge da diversidade opinativa, pode hoje substituir a essência plural do comentário político). começo por ilibar o jornalista JPH deste insólito design de interiores que assaltou esta ímpar página do jornal "Público" e, à primeira vista, visão não contrariada por uma re-tresleitura da mesma, parece-me que ela acaba por ter uma finalidade argumentativa face a uma afirmação de Pacheco Pereira de que " o PS tem de provar que existe perseguição política". ficará sem dúvida por esclarecer o quem e porquê, mas, e para glosar uma expressão que anda muito em voga no país de juízes cuja pele subitamente vestimos, a página impar deste jornal fornece suficiente matéria indiciária sobre um onde e um como. A que acresce a cereja em cima do bolo do inesgotável "sôr josé manuel fernandes" como lhe gosta de chamar um vizinho aqui do lado, quando compara um artigo assinado por dois jornalistas numa revista estrangeira à boataria anónima de um blogue assumidamente mentiroso. um dia, poderemos todos perceber melhor estas coisas, é o que me sossega o espirito. e tolero quase tudo. aliás, em tempos idos, por causa desta quase obsessiva vontade de tudo compreender, joão brites chamou-me a boa alma de tse-tsuan. há no entanto algo que é cada vez mais intolerável para mim. o mau jornalismo dos bons jornalistas. não tenho dúvidas nenhumas de que é por aí que o barco afunda. poderia, mimetizando a minha entrada anterior, pulverizar o impacto desta frase, aplicando-a na má política dos bons politicos, etc, etc, etc. pois podia. deixo isso para quem ler estas palavras. eu não quero ir por aí. o jornalismo ainda não é um não lugar deste mundo, pelo menos para mim. mas quando leio "as declarações absolutamente bombásticas" de Ana Gomes, detecto uma frase perfeitamente assassina deste ofício de, dia a dia, repôr, senão a verdade, pelo menos o mundo ao mundo. gostaria que o seu autor reflectisse um pouco nisso. já bombásticas me pareceria excessivo e opinativo. como também aquela insistência no não saber que estava a ser gravada. e a referência a Carlos Borrego. felizmente para a política, para a boa política - que também os políticos inexperientes, o que não quer dizer, maus, sabem fazer - Ana Gomes veio dar o sussuro por dito, repetindo-o num amplificador nacional, tirando-lhe a excitação do bombástico que, de uma forma relativa, se tinha colado às suas declarações. um dia haveremos de perceber melhor tudo isto. entretanto é triste que seja um leitor, que por acaso tinha ido consultar uns livros à biblioteca da Assembleia, a fazer, numa carta ao Director, o relato mais isento dos acontecimentos que se passaram quando Pedroso foi ao Parlamento.

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