segunda-feira, março 29, 2004

Personagem-Brinquedo

Semestralmente, chova ou faça sol, a minha vida é varrida por um vento quente que vem do sul. Durante vinte e oito horas tenho o privilégio de, com vinte e tal almas, me plasmar sobre a experiência da criatividade, da saúde, da doença, da pessoa, da personagem, do ser humano. A minha vida justifica-se aí. Aconteceu hoje mais uma vez. A cidade das personagens. A sala modifica-se para dar lugar a uma instalação que recria o Parque das Nações. Os personagens que começam a irromper. Uma rapariga que leva as mãos à barriga, esfregando-a. Penso que alguma dor a atraiçoa. Não é nada disso. Está grávida. Mas ainda está ali, entre a estranheza e o pressentimento de que algo está presente, de uma presença que ela não conhece ainda mas que logo mais definirá tudo, até a própria presença. O que é ou não estar presente. E o que está em jogo, mais uma vez, sempre, é esta aventura do relacionamento de cada um com esse esboço, esse esquisso, essa sombra do humano que vem, mais ou menos sorrateira e inadvertidamente, bater à porta da personagem.

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