sexta-feira, setembro 17, 2004

Calando por amor

Levo-te no carro ao meu lado e, enquanto a estrada nos foge como o tempo passado, vais conversando, as mãos em gestos quase timidos e os olhos amendoados em lampejos de sorrisos.
Falas dos teus projectos, do que gostarias de ter e ser quando fores "grande".
Falas do Futuro como quem põe um pé na escada rolante.
Chegamos ao Destino...a tua casa ... e de repente o Passado escurece-te os olhos e imobiliza-te as mãos...
Dizes-me: Não quero que entres M.
(Olho-te, e sei a resposta, mas pergunto): Porquê Passarito?
Desvias os olhos, escondes a cara e murmuras : Tenho vergonha M.
(Eu sei porquê, mas o meu papel é dar-te voz aos medos): Vergonha de quê?
A voz quase não audível: É feio M. , muito feio...mau...muito mau. Vais ter Medo M.
Respondo-te com um carinho na face e um sorriso : Não tenhas Vergonha que eu não terei Medo.
Entramos no teu mundo...
Saímos meia hora depois....
Entras no carro, sentas-te hirta, apertas o cinto...
O carro começa a rolar....
Olhas para mim muito séria e perguntas: Não tens Medo de nada M.?
Respondo-te igualmente séria : Tenho sim, tenho Medo de ter Medo.
(Cerro os lábios e penso.. E VERGONHA de pertencer a uma sociedade que permite, pelo seu silêncio e indiferença, que pássaros como tu fiquem assim de asas estropiadas sentindo vergonha de não ter casa, roupa, família...amor).
Vais silenciosa , com a face encostada ao vidro e o mundo em tumulto dentro de ti.
Eu Calo-me.
Por Amor.

1 comentário:

Anónimo disse...

Muito bonito.
Alguém