Quatro dias de gerúndio

Falando, escutando sobre a escrita do teatro. Em Madrid. A palavra dos autores, mas também a dos editores, dos directores, dos livreiros, das instituiçoes. E de Terence Nemeth, de Nova Iorque, recebo um testemunho que talvez um dia ainda possamos experimentar: um grupo de quatorze autores que se juntou para fazerem as suas peças. Publicam quatorze peças por ano, uma de cada um. E cada vez há novos grupos que querem fazer as suas peças. Tenho há uns tempos a sensaçao de que é necessário furar o bloqueio, os filtros. E somos nós os que escrevemos que podemos e devemos fazer. No final do mês, em Évora, voltaremos a encontrarmo-nos, de novo sobre a coordenaçao do Armando Nascimento Rosa, na segunda ediçao do encontro de Abril, dois anos antes. Um encontro muito auspicioso. Saímos de lá e nessa mesma noite recebemos um email do Abel Neves a desafiarmo-nos para uma bola de neve de leituras teatrais, uma iniciativa que durante quinze dias trouxe, à Eterno Retorno, à Ler Devagar e ao Clube dos Poetas Vivos - nas festas de Sao Boaventura - dezanove autores e muitos textos inéditos.

Voltaremos a isso outra vez. Voltaremos a falar do site da escrita teatral. Voltaremos a encontrarmo-nos e a ficarmos surpreendidos pelo calor das nossas maos, habitualmente frias. Admirados pela confiança de que somos capazes quando nos olhamos nos olhos e desmontamos este teatro, há quem lhe chame circo, de pequenas ou grandes vaidades. O veneno coincide com o antídoto. Encontrarmo-nos é encontrarmos mais um espaço para envenenarmos o ar que respiramos com todas as estratégias de poder, de obssessiva afirmaçao pessoal, é encontrando-nos, é falando-nos, é escutando-nos que tornamos o atmosfera menos densa, imprópria, mais respirável. Sempre o gerúndio como uma porta aberta sobre as nossas vidas. Descobrindo a delicadeza e o grande prazer de falar da peça do outro, do espectáculo do outro, da mao que escreve do outro. As coisas têm ciclos e este começo eu a conhecer. Só há uma coisa que desconheço e ainda bem. ¿Do que somos e até onde somos capazes de ir juntos?