quinta-feira, janeiro 20, 2005

"ya, não importa".

Há uma frase do comentário de Éclair que ficou no meu ar de especulação: "Até os mais novos já adoptaram uma certa atitude blasé, cool, estilo "ya, não importa". Se ao menos fosse Zen a sério, mas não, é mesmo ignorância/medo do sentir intenso". E porquê os mais novos? Há uma ideia de que os jovens vivem com mais intensidade, que amam mais e mais apaixonadamente. Para me abstrair de alguma ideia de humano, olho para mim, para o que tem sido a minha vida. Sem dúvida que aos quarenta a intensidade com que amamos, com que nos apaixonamos, é menos histriónica. Levantamos até menos vezes os braços ao ar em sinal de arrebatamento. Somos no entanto capazes de uma fusão nuclear a partir de um simples olhar, na simplicidade de dois olhos postos nos olhos do outro. Eu por meu lado nunca serei capaz de esquecer aquele primeiro momento de paixão diante de um Sonho de uma Noite de Verão pela Cornucópia expresso, no silêncio da plateia, pelas nossas mãos falantes, as nossas mãos alquímicas. Cinco meses depois casava-me. Vinte anos atrás, se eu já tivesse então mãos, teria ficado enredado nos meus temores de que o suor da minha mão a tornasse demasiado peganhenta para deixar que a partir dela houvesse um vislumbre do meu estado de alma. Não há aprendizagem do intenso sem tempo, sem duração, sem durarmos diante do outro e isso, quase nenhuma juventude nos pode dar. Falo por mim mais uma vez.

5 comentários:

Anónimo disse...

Very True.
O que é "durar diante do outro"? Tudo se presentifica na intensidade pelo outro?

Éclair

JPN disse...

ainda hoje falámos disso no teatro. durar diante do outro é permanecer "duradouramente" no tempo. isso acontece.

Anónimo disse...

Sim, claro que acontece. Eu gostei muito da expressão mas pôs-me a pensar na qualidade desse diante e sobre quem é o outro que encaramos. É que às vezes corremos o risco de ficar a olhar para o espelho em vez de embarcarmos no rosto de outrém.

Éclair

JPN disse...

agora sou eu que pergunto, "o que é embarcar no rosto de outrém?"?

Anónimo disse...

O "embarcar" vem de Emmanuel Levinas ("... être embarqué -- événement dramatique de lêtre dans le monde") e é isso mesmo, embarcar, partir de si e do que se conhece, deixar espelhos e terra firme para trás em busca do que... vier. Num outro rosto.