quarta-feira, fevereiro 09, 2005
Tralha o quê?
Uma resposta a um comentário (do Manuel do Pé de Meias) em que havia uma referência à tralha (guterrista) colocou-me de sobreaviso. A resposta extravaza muito o âmbito do comentário e por isso é com todos que partilho esta reflexão. O que é que é isto da tralha? E porque a utilizamos com esta recorrência sem explicarmos mais? Estaremos assim tão por dentro do seu conteúdo que se justifique o abreviar?
Principalmente porque este tipo de expressões vazias vêm carregadas de ambiguidade. O emissor e o destinatário sabem que não estão no mesmo comprimento de onda mas ambos não apostam na descodificação simultânea da mensagem. Dizes tralha ( e quererás dizer todo o elenco guterrista) e eu sorrio, a tralha (e terei entendido os narcisos, os gomes, as edites).
O processo da comunicação tem destas coisas. Pode ser utilizado para matar a comunicação. Esta, em tese, é produção de conhecimento. São vasos circulantes de informação. Mas depois surgem estas muletas na comunicação. Não transportam conhecimento. Pedem reconhecimento. Dizes tralha e um botão acende-se, já ouvi isto, já esqueci a origem, ainda bem, assim não posso dizer, não, não é exactamente tralha sabes, é que fulano quando disse isso estava a falar de.... Se a chave da comunicação política é a tentativa de convencimento do outro através da utilização de informação, a retórica do reconhecimento é uma linguagem própria da sociedade do entretenimento. Dizes tralha e eu sorrio, a tralha, e passamos mais um bocado de tempo. Entretemo-nos. O reconhecimento é a cumplicidade necessária para que a comunicação continue na cidade do entretenimento. Eu pergunto, a tralha o quê?, e é uma chatice. Lá temos nós que voltar a ocuparmo-nos da política. Olhas-me com ar desconsolado.
O que é curioso é que esta asserção se metamorfoseou. Creio que quando ela foi criada, não sei por quem, ela se referiria ao regresso à primeira linha de fogo político de um conjunto de personalidades de terceiro e quartos planos do tempo de António Guterres. A tralha de Guterres. Só aí aliás esta metáfora teria alguma eficácia política já que seria uma critica que poderia ter uma abrangência política muito maior. Poderia ser, por exemplo, em determinados contextos, um socialista a dizê-lo. Agora se não o é, se com tralha se se refere a todos aqueles que estiveram no governo com Guterres, a expressão merece ser contraditada.
Em primeiro lugar porque os dois Governos de António Guterres já foram, admito que justamente, penalizados pelos pecados que cometeram mas ainda não foram lembrados pelas virtudes de que foram protagonistas. Ora é uma insensatez. Das suas virtudes de realização todos nós somos beneficiários e é importante que delas tenhamos consciência para as podermos defender. Embora enquanto cidadão tenha como mais valias desse contributo por um lado a defesa dos valores sociais, de uma sociedade mais confiante em si mesma, mais solidária, e de essa defesa ter sido feita atendendo aos aspectos económicos das diferentes politicas sociais, por outro as politicas ambientais (continuando o trabalho inovador de ministros e secretários de estado dos governos sociais democratas, é no campo da actividade cultural que eu posso, com algum rigor, comprovar a diferença abissal de entender e trabalhar as questões culturais de Manuel Maria Carrilho. Estou ligado à actividade cultural, com entradas pela animação cultural, pelo teatro, pela expressão dramática e pela escrita para teatro, desde 1983. Sei o que todos sentimos ao longo de todos estes anos com a incapacidade de termos politicas culturais consequentes.
Terei aliás, neste aspecto, algo mais a dizer. Era independente quando tudo isto aconteceu. E uma das razões que me fez aderir ao Partido Socialista foi perceber que era necessário internamente defender a qualidade do trabalho do primeiro governo socialista na Cultura. É que devido às idiossincrassias de Carrilho o seu trabalho era muito mal amado entre os próprios socialistas.
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