segunda-feira, março 14, 2005
O amor aos que amam
Aos amantes de sábado e de domingo e de segunda e de todas as horas que uma vida pode segurar
Ainda a tarde não caira sobre a esplanada da graça, estava eu só
como nunca estive, dei por mim a dizer-me aquilo que não pode
ser dito: que a única força que move este mundo é o amor.
E não é só isso, porque tal é dizer pouco, quase nada
do que o fogo faz, pode fazer, a um ser inclinado.
Ainda a tarde não caira em mim, as mãos dos amantes pousavam
uma sobre a outra,
e já eu pensava em como é triste este tempo que não conta, que não se enumera,
e tudo porque não podemos amar com os amores de outrém. O que é injusto. O que
é, na forma como o mundo se organiza, uma tremenda injustiça. Porque eu, que estou aqui na distância que beber o meu chá de jasmim é, e nos meus olhos tenho os espelhos de água dos amantes desavindos,
saberia, do longe de onde os alcanço, o que falta àquele amor para ser dança, pés de fogo, corropio, volúpia. É mais uma injustiça do mundo a somar a todas aquelas outras
que fazem da urgência a matéria poética mais relevante do mundo em que vivemos.
Falta-nos o amor e não podemos, mesmo quando o saberíamos, amar. Porque só se pode amar quem se nos entrega e a quem confiámos. Tudo e toda a nossa vida. A quem dizemos: leva-me com essas tuas mãos tão agéis,não me deixes cair em esquecimento.
É uma injustiça terrível que recai sobre o dorso dos amantes, que ficam a seu cargo com essa dor de mundo. E nós, carecidos de mundo, carecidos do amor que esse mundo cria, aqui, só podemos esperar e confiar no amor dos que amam.