sábado, junho 11, 2005
Pedem tanto a quem ama
Exactamente depois de fechar ontem o turno da manhã aqui no Respirar e de escrever um post sobre a minha sensação de gajo inclinado, deparo-me com este post do Luís. Pensei em escrever sobre o amor. Penso muitas vezes em escrever sobre o amor. Há pouco, encontrei este post e reparei, o tema está aí. Embora não tenha por hábito pensar em cibercafés, irei também falar de amor. Escutando.
O Luís (L.) é das ciências exactas e a Elisa (E.) é daquela ciência humana que sempre mais se quis parecer com a exactidão. Eu sou de uma ciência-que-não-é. Sucedânea da filosofia que degenera no mundo contemporâneo. Nem é uma ciência, é um projecto transfronteiriço construído em torno da comunicação. Mas temos, pressinto-o, uma inclinação comum: o duplo das palavras. Herberto Helder, no princípio das palavras, pedem tanto a quem ama, pedem o amor.
A minha condição de recolector de discursos desobriga-me de pegar num pensamento, sempre alheio. Não penso pela minha cabeça desde que me conheço. Aliás, não foi por causa de uma ideia própria que me seduziu a ideia de falar também de amor. O que me atraiu, como a um covil, é sempre assim, foi a fala que precede os discursos. O Luís (L.) fala da dureza. Ou melhor, da pretensão da dureza. Não há amor, há esperma entalado nas dobras do latex. O ritual de dar o nó já há muito que não significa casório, sim aquele atar final do preservativo. É bom que assim seja. A Elisa fala da alma que não existe mas de repente toca num espaço vazio. E é aí que a minha alma de recolector ergue cuidadosamente a pinça e com todo o cuidado começa por abanar a ideia, fazendo-a soltar de todo aquele contrabando a que chamamos pensamento mas que não é senão apenas o momento que antecede o pensamento e que por isso é um verdadeiro espaço em branco, vazio e que pode ser ou não ser, depende. Aqui fica o modo como na minha cabeça se juntaram estas duas falas. Eu sei, é vício de ofício, transformar as falas em vozes.
L.- "O amor romântico foi uma invenção das mulheres para limitar os estragos da filandria masculina. Já tentei explicar isto de diversas maneiras, com posts esforçados. O amor romântico, um meme inútil, só sobrevive a si mesmo como um fósforo frio. O amor romântico já não é preciso.".
E. - "Às vezes dava-me jeito ser romântica e procurar descrever-te como se te amasse profundamente.Dava-me jeito ser romântica e procurar descrever-te como se te amasse profundamente. Amar profundamente é outra treta romântica que ninguém sente, mas gosta de dizer, só porque sim. "
L. - " A partir do momento em que as mulheres controlaram a ovulação, o seu comportamento passou a assemelhar-se muito ao dos homens. A maior parte dos encontros sexuais é hoje não reprodutivo. Esperma derramado em vão em dobras de látex, não chegando às mucosas de mulheres duplamente protegidas."
E. - "Se eu fosse romântica como são românticas todas as gajas, diz a sabedoria popular... essa ciência profundíssima das regularidades dessa coisa que eu não tenho. A alma. Dir-te-ia que estou a sentir-me sozinha. Agora. Que deixaste aqui um espaço vazio. E que amanhã preencherei. Mas hoje não."
L. - "O cérebro dos encontros continua à solta. Mas a sua deriva é sem sentido. O cérebro prodigioso das mulheres humanas solta-se do determinismo genético e constrói um comportamento novo, delicioso deve dizer-se, porque mistura tudo o que de interessante a cultura e a necessidade produziram nos últimos milénios."
E. - "Hoje quero o lugar vazio. Para me lembrar dos teus cabelos e do cheiro dos teus cabelos. Os teus cabelos que são apenas os teus cabelos. Tal como as tuas mãos que são apenas as tuas simples mãos. E da tua pele que é apenas a tua pele. Não há metáforas para ti. "
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
1 comentário:
Credo... nem sei se agradeça, se não agradeça ou que faça. Hum...
Enviar um comentário