segunda-feira, setembro 12, 2005

Aclaro-me na música, no silêncio, no futuro

Desligo a luz da sala. É na escuridão que me procuro agora. Aclaro-me assim. Não te disse nada mas muitas vezes quando falo contigo estou aqui, no escuro, iluminado apenas pela tua voz. E tu sabes a que espaços ela me chega. Esquece o que eu te digo. O que te escrevo. Esquece tudo. Lembra-te de mim aqui, no escuro, a sentir-te. Vejo o sempre aqui na palma da minha mão. É uma casca de noz. Um pedaço de alecrim. Jasmim. Tu espantas-te quando eu te digo que apenas confio no que tu sentes daquilo que eu sinto. É em ti, no que a ti te chega de mim que sou verdade, a verdade que me interessa. Não sei se se repara mas escrevo pausadamente. Como se falasse a tempos, entrecortando as minhas com as tuas falas. Sempre gostei de falar pausadamente. De ficar assim, agrilhoado ao meu não entendimento das coisas. Aprendi o destemor contigo. Aclaro-me na audácia. O tempo que medeia entre as palavras que escrevo é o necessário para percorrer a minha vida em imagens. Há quarenta anos em Mafra. Parece-me muito porque tudo isso sabe-me a tempo retirado ao nosso encontro e eu quero-te para sempre. Não, eu não te quero no sempre que isto for, ou no sempre que isso é, ou aquelas tretas que inventamos para não termos medo da morte: eu quero-te mesmo para sempre. A vida e morte assim, no mesmo quadrante. O sempre enche as nossas vidas de tragédia. No sempre que o longe é, aclaro-me, afuturo-me. Vejo a minha vida em imagens e estremeço, isto está a ficar demasiadamente intímo. Não sei o que fazer das nossas vidas, meu amor. Vejo-me, aclaro-me, afuturo-me. Há muitos e muitos anos tropecei no relógio grande que está em cima da sala de todo o nosso universo. Disse, o meu tempo perdeu-se nas horas do mundo e agora não encontro o fio da meada. Foi um momento menos bom da minha vida, que o diga o velho Palma, ele foi um dos que, a 33 rotações por minuto, me ajudou a vir à superfície. É por isso que eu acredito não no poema, na poesia. Devemos trabalhar incessantemente para acordar a poesia no devir do nosso mundo. Um poema na vida de uma alma desesperada vale tudo, vale por vezes uma vida. Gosto de te comer o sexo com a minha língua, de mastigar a tua glande como se fosse um pequeno feijão, gosto de atravessar o teu peito e dizer, as tuas mamas, gosto de entrar dentro de ti e surpreendido pelo meu próprio feito arrebentar com a minha voz mas o amor ainda não é aí, o amor ainda não é aí, meu amor. O amor é quando juntos, epifânicos, nos levantamos e voamos pela janela aberta dispostos a tudo fazer para acordar a poesia do mundo. Perguntaste-me no outro dia pelo valor das palavras. Eu não te respondi, lembras-te? Não respondi porque teria de o fazer com palavras e as palavras não servem para termos a certeza, ou para sabermos. Nós temos a certeza, sabemos, confiamos, descobrimos indepententemente das palavras que dizemos, ocultamos, silenciamos. Talvez seja uma maneira muito política de ver o amor, para mim ele é um trabalho inacabado sobre o silêncio. É música, o amor.

1 comentário:

Anónimo disse...

Belo, tão belo.
De repente, já era tarde de mais; as lágrimas caíam no teclado.
Limpei as letras, senti-me iluminada por este momento.