quinta-feira, agosto 02, 2007

A propósito de uma desistência, uma explicação: o buraco do ozono

O meu post desistência não encerra nenhum juízo de valor sobre o que é realmente importante fazer, falar, dizer. Apenas o reconhecimento de que eu não sou a melhor pessoa para falar sobre as derivas dos socialistas pelos territórios da direita. E quanto menos sei falar sobre um assunto, mais longamente falo sobre ele, já se reparou. E escrevendo eu tão pouco ultimamente, apeteceu-me não gastar o meu tempo e o dos que me lêem para acabarmos por descobrir que não tenho muito de interessante a dizer sobre o assunto. O que eu acho importante é o que o Luís escreveu na réplica de comentários que se seguiram no post a que fiz referência:"Que falta de imaginação pensar que não há alternativa possível ao capitalismo e ao modelo rasca lusitano. "
Se eu soubesse escrever sobre isto, escrevia. Seria o meu primeiro e único post verdadeiramente político. Mas não, perco-me em derivas pessoais sobre o discurso de uma direita populista que mimetiza os comportamentos tradicionais da esquerda. Ou sobre uma esquerda caviar, lagosta ou percebes. Não sei se é do buraco do ozono mas não são apenas as estações que se desregularam: a esquerda e a direita também já são totalmente imprevisiveis. Como é que eu ou alguém poderemos escrever alguma coisa inteligente sobre isto?
Não podemos.
Tudo isto é um verdadeiro desconvite à inteligência das coisas. A única coisa que há a dizer é aquilo que o Luís apontou (depois de se ter baralhado um pouco no final do seu post), a iniquidade, e que foi aquilo que há uns anos José Mário Branco soletrou no seu histórico F.M.I.:"...que ainda há gente que acha natural haver campos por cultivar e mãos desempregadas!".
Há alternativa ao modelo de capitalismo em voga, e, como lhe chamou o Luís, à sua adaptação rasca entre nós. O que não há é alternativa ao modelo de capitalismo em voga que mantenha do mesmo modo o status quo do modelo de capitalismo em voga e isso é que preocupa sobremaneira os teóricos da não existência de alternativas ao capitalismo em voga.
Há duas correntes literárias, filosóficas e politicas que defendem a não existência de alternativas ao capitalismo em voga que acho particularmente engraçadas:
- a primeira é a que defende que o modelo é bom, venceu, convenceu e por isso o que há é que, com aquela superioridade moral que vem da ignorância histórica de associar o sistema democrático ao modelo capitalista, reformar o mesmo, suavizando-o;
- a segunda é a que assume que o modelo embora seja mau, caduco e agonizante, tem tando receio daquilo a que carinhosamente chama as suas utopias como do dilúvio que virá quando o estado capitalista desabar e as hordas de excluídos chegarem à cidade;
Eu prefiro encarar as coisas de um modo bem mais pragmático: a questão não é saber se existe alternativa ao capitalismo, é ter consciência de que com ele nenhuma alternativa se coloca à aventura humana e por isso ou assumimos que estamos em fim de linha ou teremos de bramir novamente a espada dos recomeços.
O problema, e é um problema suficientemente grave para o levarmos a sério, é que estamos a criar um estado de espirito desfavorável ao pensamento, à interpelação, á dúvida e sem essas faculdades da capacidade de produzir juízo, torna-se muito difícil abrir caminho entre o amontoado de toneladas de ferro-velho ideológico que as fábricas de produção ideológica produzem.
[E de repente o meu filho acordou e veio até à sala aninhando-se em mim. Não consigo dormir, pai. Digo-lhe para ir para a cama, já lá vou ter. Abeiro-me da sua verdade, da sua poesia. ]

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