Ontem não foi tanto a chuva ou o ribombar que me pôs numa vigilia mansa. Era a ansiedade. De pensar se conseguiria chegar, com o saco das prendas, antes da sua saída para o colégio. Ainda maldisse umas quantas vezes esta vida moderna que nos arranca as crianças da cama ainda o sono estremunha. Mas não vale a pena. "Entraste no jogo, agora tens de jogar!". Como eu me lembro de quando era criança e tinha, ao primeiro olhar, o rosto da minha mãe e do meu pai ao lado da bola de cautchu, dos lápis de cera, de um livro e de uma guloseima. Somos tanto o que nos fizeram. E na volta, já com os deveres de pai cumpridos, já depois de ver aquele salamaleque com pernas a correr para a sala de aula, num metro atafulhado de gente, que nome bonito para uma estação, Quinta das Conchas e dos Lilazes, eu sorria, sorria. São tão fugazes e efémeros os nossos pequenos heroísmos, as nossas alegrias, os nossos contentamentos. São tão fugazes e efémeros os nossos pequenos heroísmos, as nossas alegrias, os nossos contentamentos e bastam-nos tanto. Fazemo-nos com tão pouco. Um sorriso de criança e depois o regresso à mole, a esta compressão de atómos tristes e resilientes com que fazemos cada um dos nossos dias de chuva, não me vou esquecer daquela rapariga que teria pouco mais de vinte anos, com um bebé que era quase do seu tamanho, ouvia falar com uma amiga, telefonei para lá, não se pode andar no Lumiar, está tudo cheio de água, disse-lhes que ía demorar, que tinha de levar o miúdo à creche, não quiseram saber, a sério?, a sério, disseram-me tens de estar à tua responsabilidade, vou com ele, não o posso entregar, não o vou deixar no meio da rua, vai comigo, mas custa. A mim também me custou. As nossas vidas assim ainda custam mais um poucochinho. Não a minha, estava a sorrir, lembram-se?
5 comentários:
Já sete anos? Então, parabéns!
Rui Mota
Muitos Parabéns para ti, para a Isabela e para esse miudo fantástico
enganei-me, queria dizer para a Isabel
'brigados Rui e Sete e Picos
um abraço de parabéns para o miúdo que cresce. E para o pai dele que está ao lado. Claro.
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