segunda-feira, maio 26, 2008

As corridas de sky no toldo

Da última vez que estivémos juntos eu estava muito impaciente com a sua incapacidade de estar sem fazer nada. Se não era a psp (playstation portátil) era a televisão ou um vídeo ou uma terrível seca. Se não tivesse de escrever posts sobre a nossa relação talvez tivesse entrado ali numa espiral de descontrolo. Mas a nossa relação é, para todos os efeitos, uma coisa pública. Tenho de ter alguma compostura. Tentei abordar o assunto de forma pragmática.
- Tens sempre de estar a fazer alguma coisa?
Ele olhou para mim a pensar - ele ainda não tem esta sensibilidade para o facto de aquilo que ele diz ser um possível post - o meu pai pirou. Chovia na altura, o que é terrível porque transforma qualquer impeto para a acção numa possivel sentença de hiperactividade.
- Assim é uma seca!
Fui sentar-me ao lado dele. Eu estava disposto a ceder tudo, claro. Como é que se explicam estas coisas a um miúdo de sete anos. Disse-lhe com voz pausada:
- Sabes que por vezes podemos tentar ficar quietos a escutar as coisas. A olhar para as coisas.
- Pois, ganda seca! O pai só diz isso porque tem o computador avariado.
- Achas?
- Tenho a certeza.
- Não é nada disso.
- É, é. O pai também está sempre a fazer alguma coisa.
- Estou?
- Está. A arrumar a casa, a fazer comida, a pôr a mesa, a trabalhar no computador. O pai por vezes é uma seca!
- Já disseste três vezes a palavra seca.
-Eu não tenho culpa que o pais seja uma seca.
-Tenho uma ideia.
- Essa ideia deve ser uma...
- Seca?
Foi apanhado em falso:
- Ó pai, assim nunca mais fazemos nada.
- Olha, estou a olhar pela janela.
- Sim, eu estou a ver, dahhhhh...
- É muito divertido.
Não respondeu. Deixou-se estar, com a sua sabedoria de sete anos e pouco. Há vezes em que é melhor deixar seguir a corrente.
- Não acontece nada.
- Olha as gotas de água a descerem pelo toldo.
Era realmente um espectáculo divertidissimo. As gotas de água desciam a encosta do toldo em ritmos completamente diferentes:
- Parece que estão a fazer sky.- disse ele rindo a gargalhadas despregadas dos movimentos imprevistos das gotas de água que pareciam correr a um ritmo de cinema mudo. Por vezes não havia nenhuma e depois, com um pequeno açoite de vento, lá caiam em rabanadas.
E assim tivémos uns bons dez minutos. No fim propús-lhe ainda que identificássemos os sons que vinham do quintal. E claro, depois desta pequena vitória ele acabou por ganhar também um adicional de quinzse minutos na psp. -

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