sexta-feira, junho 13, 2008

A não Política (rescaldo do bloqueio)

da violência. é o primeiro ponto: aquilo que nos afecta, pessoas que pensamos de maneira diferente, ao ponto de nos colocar a pensar da mesma maneira (e da direita à esquerda independentemente do ataque ou não ao governo o que se ouviu em quase uníssono foi o destacar desta ideia de ilegalidade, de destruição de bens, de ataque a pessoas, de pressão ilegítima e ilegal sobre quem não aderiu ao bloqueio) é a violência. e, sabemo-lo de outras vidas, de outras situações, a componente simbólica da violência. nesse aspecto, o simbolismo, não deixa de ser desafiante pensar porque é que a destruição da propriedade nos desestabiliza tanto.
vamos então falar desta violência: falou-se dela como algo ilegítimo e ilegal (o que faz todo o sentido numa sociedade democrática que tem como uma das funções principais a regulação da violência). só que ao falar-se do bloqueio também se falou dele como algo de ilegitimo e ilegal já que:
a) não era uma greve; b) era mais parecido com um lock do que com uma greve ; c) não deixava circular os outros camiões;
dando assim a entender que o bloqueio era uma acção violenta.
Não era e é facilmente perceptível isso se observarmos a dimensão dos estragos e das perdas de vidas. Mas também se dermos atenção à reportagem em Vila Verde, onde se registaram feridos num piquete de bloqueio. Se observarmos aquelas imagens ouvimos um dos feridos dizer que não compreendia a reacção do outro que o atropelou, porque eles só iam falar, explicar. E também o colega do outro. E mais um que se meteu no carro e foi denunciar o que atropelou à polícia (ou seja, que pensava que estava a actuar legalmente). É claro que para qualquer um dos que lê o respirar, como para mim que o escrevo, aqueles tipos são pessoas que têm poucos recursos argumentativos, que estão muito mais dispostos para a porrada de aldeia, e que só podem fazer-nos desatar à gargalhada quando aparecem com ar doce a dizerem: " a gente não intimidou nada que a gente até nem teve tempo para isso...a gente estava de boa fé e íamos ´so falar". Ou seja, qualquer acção não violenta encabeçada por façanhudos com os quais não apetece discutir um argumento que seja tem à partida uma potencialidade de desencadear acções violentas. Só que estes tipos não leram o tratado da política de Aristóteles. Têm da política imagens. Querem parar, fazem greve mesmo que não seja greve porque eles são patrões. Querem explicar aos outros a justeza das suas ideias, fazem piquetes, mesmo que não saibam explicar e que na queda livre do argumento lhes saia o corte dos travões, o apedrejamento. Ou sejam, são pacíficos se os outros acolherem as suas ideias mas se não forem partem rapidamente para o argumento brutamontes. Uma palavra ainda sobre a violência: numa reportagem sobre uns camiões incendiados via-se o proprietário desconsolado porque eles estavam parados. "-Só se fosse por não ter ido para a estrada com eles", lamentava-se, ele que também tinha aderido á paralisação. Ou seja, o queimar destes camiões foi um crime que não resultou directamente de uma acção política, o bloqueio, já que a sua vitima tinha aderido ao mesmo.
da política. Se observarmos este bloqueio como uma acção política, percebemos que ele teve comportamentos ilegítimos de intimidação, de ataque fisico a pessoas e bens, e que esses comportamentos resultaram muito mais de uma incapacidade em sede de argumentação política do que de uma intenção em fazer valer o argumento da violência (por isso a comparação com o terrorismo parece completamente estapafúrdia). Ou seja, a violência é uma componente que quase parece indissociável do movimento mas não terá sido senão ocasional e o sintoma de incapacidade política do mesmo.
O que é interessante é tentarmos perceber porque é que temos tantas resistências em atribuir um valor político a este movimento e nos sentimos tão motivados a colocá-los fora da politica, no domínio da selvajaria, da violência. Usou-se muito o argumento de que se isto fosse um movimento grevista os seus piquetes seriam recebidos à cachaporrada pela polícia sem nunca tentarmos perceber que se isto fosse um movimento grevista também estaríamos muito mais disponíveis para entender o que aconteceu como excessos do mesmo e a não o identificarmos como um movimento violento, porque creditariamos esse movimento com o histórico dos movimentos sindicais e atenderíamos ao caso isolado da manifestação violenta.
Aqui não. Não há sindicatos, não há partidos de oposição, não há esquerda. Todos querem apenas que rapidamente o governo solte a canzoada e ponha os víveres na nossa mesa. Que isto da democracia é muito bonito mas ai que ai vem o meu rico santo antoninho e eu quero sardinha fresca, alface, repolho, tomate e pimentos à mesa, o resto, que se f. E o mais interessante é percebermos que grande parte de nós que assim pensa também não acredita grandemente no sistema de representação politico actual. E espantosamente mais interessante, se pensarmos que este e o outro factor também condicionaram muitos dos sectores de esquerda a atribuir valor político ao movimento: insurgimo-nos contra o facto de trezentos mataruanços camionistas e proprietários porem o país à beira de um ataque de nervos mas convivemos tranquilamente com a suspeita de que individuos como Belmiro, Joe Berardo ou Standley Ho, por exemplo, tenham sequestrado a agenda política por causa dos seus interesses pessoais.
Mesmo que tenhamos pouca empatia com o movimento dos empresários, devemos aceitar que a sua partida para a defesa dos seus interesses, e da forma como o fizeram fora das estruturas institucionalmente formadas para os representarem, representa um direito legítimo e mais até, uma atitude positiva de quem não se revê nos seus representantes. Todos fizessem assim. Todos os que não se revêem nesta missa politica em que uns fazem de nós e nós fazemos de coisa nenhuma saltassem para a rua e dissessem, existimos, porra, e a política haveria de ser diferente e outras personagens haveriam de aparecer no nosso horizonte político.
É claro que este arroubo político dos empresários durou pouco. Ainda chegaram a pensar fracturar-se na Batalha, mas isso da Batalha foi há muito tempo, o movimento extinguiu-se politicamente - talvez tenha sequelas na próxima reunião da Antram, mas terá morrido por agora- e foi absorvido pelas negociações com a Antram.
Há muito tempo que não víamos uma coisa assim, uma lista de vendecores tão original, e isso não pode deixar de ser um elogio da política, ela própria: venceu o Governo, venceram os empresários brutamontes. Perdeu a oposição e, por incrível que pareça, aquela que nunca perde: a opinião pública ( e os que colaboram na sua formação), enquanto representante dos consumidores. O país não estava nem a saque, nem por um fio, nem à beira do colapso. A Protecção Civil também terá ganho alguma coisa com este que foi bem um exercício de simulação de uma crise. E se calhar temos mesmo, rapidamente, de nos preparar para mais.

1 comentário:

apicultor disse...

Acho que virá mais, muito mais, e menos cool.