segunda-feira, abril 06, 2009

Ça ne c'est pas une cause

Ainda no outro dia, a propósito do célebre processo que levou uma jornalista a tribunal por ter chamado enxofrável a um militar de Abril, comentávamos que os tempos mudaram muito, que hoje já ninguém levanta processos assim, por dá cá aquela palha. E zás, sai-nos logo esta notícia de que José Sócrates processou João Miguel Tavares, por ele ter dito que Sócrates ao falar de moral na política lhe soava tão convincente quanto lhe soaria Cicciolina se esta surgisse a defender a monogamia. Não vem aqui ao caso o facto de me parecer um profundo disparate a ideia e até um pouco chula a comparação, mas penso que não só JMT não é obrigado a ser razoável em tudo o que opina, como também, que com algum bom senso terá feito as suas contas e pensado que haveria mais probalidades de apanhar com um processo por parte da Cicciolina do que do nosso PM. O que sobrevive deste caso , como escreveu outro Tavares, o Rui, é que é um disparate político, pessoal e ético levar alguém a tribunal por causa da sua expressão de que não se sente convencido pelo outro. Se a intenção de Sócrates é convencer Tavares, João Miguel, talvez seja melhor usar de outros meios. Se a intenção é inibi-lo de expressar o que pensa, ui, mau maria, estamos mal. É por isso que não sendo própriamente uma causa mas um caso, há pouco não hesitei quando uma amiga me mandou pelo facebook um pedido de subscrição de uma causa, a solidariedade com o João Miguel Tavares. Voilá!
[Sofia Loureiro dos Santos manifesta algum desconsolo sobre a reacção à notícia de que Sócrates moveu um processo contra JM Tavares. Eu também. Esperava dele um pouco mais de domínio. É claro que é uma patetice fazer disto uma causa, uma causa a sério, não falo das causas a brincar do facebook. O primeiro-ministro não atentou contra a liberdade de expressão de Tavares. Só o faria se conseguisse, por meios ínvíos, que os tribunais lhe dessem razão. Ora todos sabemos como é que isto vai acabar. É claro que Sócrates tem todo o direito de se sentir ofendido. Como nós todos, os que votaram nele e os que não votaram nele - assim, uns constrangidos, outros com gáudio, como donzelas vitorianas exigindo dele a ética e a decência que nunca lhe reconheceram - temos o direito de achar que ele foi um palerma por se sentir ofendido. Ou por outras palavras. Sócrates terá - como todos nós, aliás, esta nossa presunção com que nos passeamos pela vida só aparentemente nos obriga à inteligência - sempre todo o direito de ser um palerma. Como nós também temos o direito de lhe puxar as orelhas e lhe dizermos que não queremos um primeiro-ministro que não abdica do seu direito de agir como um palerma.]
Adenda Final (actualizado a 9 de Abril depois de ler este post da escrita em dia que remetia para est'outro do blogue de Rolo Duarte): João Miguel Tavares esclareceu em nota que "Por muito tentadora que possa parecer a ideia de ir a tribunal discutir tangentes entre o primeiro-ministro e a ex-deputada italiana, há que fazer justiça ao engenheiro Sócrates e ao escritório de advogados do dr. Proença de Carvalho e esclarecer que fui processado por muitas frases desse artigo, mas nenhuma delas inclui antigas estrelas de cinema pornográfico. Lamento pôr em causa tanta criatividade textual e visual que saiu em meu auxílio na blogosfera, mas opiniões são opiniões - e factos são factos”."
Parafraseando o nosso eterno Vasco Santana, palermas há muitos. Ou no mais bem intencionado post cai a palermice. Eu, por fim, enterro o chapéu até às orelhas.

2 comentários:

Anónimo disse...

A piada das probalidades é de referir, e não consigo deixar de me preocupar com o ridículo a que chegámos.
Não será o momento de refundarmos sistema? De atulhar a assembleia com petições??

Emídio Gardé disse...

Bom dia:
"Ainda no outro dia, a propósito do célebre processo que levou uma jornalista a tribunal por ter chamado enxofrável a um militar de Abril,(...)" - lembro-me desse memorável episódio da justiça portuguesa. Mas, neste momento e para uma pesquisa mais aprofundada para fins científicos, necessitava de ter mais referências desse acontecimento (datas aproximadas) - e não descubro nada on-line. Alguma dica?
Obrigado,