terça-feira, março 16, 2010

O silêncio de Eduardo Lourenço

De um lado Diogo Lucena, António Pires de Lima e Miguel Morgado. Do outro José Gil, Eduardo Lourenço e um médico, ligado ao Hospital de Santa Maria. Ali a discutir sobre a crise, sobre o paradigma económico, sobre isso. Isso, o quê? Isso, não interessa. Diogo Lucena disse aquela que foi para mim a primeira coisa verdadeiramente interessante (e eu tinha perdido os dois filósofos): a Europa está a reajustar-se a um equilibrio mundial depois de ter vivido a euforia de uma supremacia civilizacional, económica e política que não é de forma alguma uma constante da história da humanidade. Depois, Miguel Morgado, fez um ataque frontal aos dois filósofos presentes. Foi brilhante, contundente, assertivo. Eles não responderam logo, havia que respeitar uns cinco minutinhos para publicidade. É o momento de glória de Fátima Campos Ferreira, o momento em que ela é verdadeiramente a dona do jogo. Depois da publicidade os dois filósofos vieram reafirmar o que tinham afirmado e, consequentemente, o inconciliável que os unia contra Diogo Lucena e Miguel Morgado. Curiosamente António Pires de Lima conseguiu com duas ou três generalidades obter o pleno das referências referenciais dos dois filósofos. Foi um momento menos feliz de Gil e de Lourenço até porque evidenciou as generalidades com que organizaram os seus discursos sobre a economia e a política. Com uma ou duas excepções. Foi penoso ver os dois filósofos e perceber que eles sabem discutir e argumentar tão mal. Dizem meias palavras, enrolam-se, dá vontade de nos fecharmos nos seus livros, nos seus textos e esquecermos a retórica verbal. Excepto num momento. Quando Eduardo Lourenço começou a enrolar-se no seu discurso sobre os imperialismos, sobre a dominação americana, a certa altura começou a parar o fluxo discursivo. Levou a mão à cabeça, instalou pausa, tempo. Não era o que ele dizia, era a evidência daquela tensão no dizer que reinstalava novamente na sabedoria, o gesto de Lourenço. E aí pouco pode o brilhantismo de Miguel Morgado. Nada há de tão rebarbativo, de tão insinuantemente retórico, como o silêncio, o tempo a passar pela expressão de Eduardo Lourenco.

2 comentários:

Anónimo disse...

Curioso querer dos filósofos uns debatedores bem apresentados e verborrágicos. Debate nem sempre é diálogo. Ainda bem que há quem se dedique à reflexão de fato, ainda que pareça que tu preferias ali uns sofistas com ar jornalístico.

JPN disse...

Que comentário mais estranho! Se há coisa que eu pareço que quero é que dois dos meus filósofos preferidos não vão ao Prós e Contras. E já agora, que elaborem um pouco mais as suas reflexões sobre a economia e a política. Ou que passem a palavra. Já que sabem como ninguém povoar o silêncio.