A política torna-se sócia da magia. Sócrates, nas cordas, faz um dos melhores discursos, fala destemidamente verdade mas a barulheira é tal que não se conseguem perceber três coisas: a primeira de que quem quiser colar a manifestação de 12 de Março a uma manifestação anti-Sócrates, está a fazer um aproveitamento político partidário ilegítimo desta manifestação ( e provavelmente a não perceber a análise política que todos os partidos têm de fazer); a segunda, a de que a demagogia da análise política de comentadores como António Capucho ( este chegou a dizer esta coisa espantosa, " é claro que ninguém quer ir para o governo nesta altura porque é preciso resolver muitos problemas", de Teresa Caeiro, Luis Fazenda e até (pasmo!) de Rui Sá, quase fazem Sócrates parecer aquilo que em dez anos de governação nunca conseguiu verdadeiramente ser: um estadista; a terceira de que nem PSD, nem CDS, nem BE, nem PCP, nem Cavaco ( e eu diria, que com alguma ironia, o próprio PS) têm mais desculpas para não fazerem aquilo que devem fazer já que do cruzamento das palavras de Sócrates com as das posições de todos os partidos resulta claramente que não se vislumbram condições para uma continuação de um política minoritária, principalmente quando, como referiu e bem no outro dia Daniel Oliveira, se assiste a um golpe de estado da Comunidade Europeia, através da comandita da Sra Merkel, obrigando os Estados a alterações significativas que não foram sufragadas pelos diferentes eleitorados.
Por outro lado Sócrates, por mais que pareça um estadista, não o é. Se o fosse perceberia que não pode criar unidade política verdadeira sem a coesão social e que não pode desprezar nem os desníveis de classe que existem, nem o peso que a gordura pública tem para o descrédito de políticas impopulares. E muito menos que, por exemplo, não pode patrocionar medidas como a facilitação do despedimento numa medida que não parece ter nenhum efeito prático no défice ( e consubstancia aquele golpe de estado de que falava o Daniel). Ou que não pode deixar de clarificar o peso real de grandes investimentos para a despesa pública. Se fosse um verdadeiro estadista teria percebido que devia ter olhado de outra forma algumas das propostas económicas do Bloco de Esquerda (independentemente dos erros deste).
Não há hoje alternativa a um governo sustentado numa grande unidade nacional indispensável para tomar as medidas duras que têm de ser tomadas. É uma mera questão de tempo. Na altura em que a crise se insinuava escrevi várias vezes de que tinhamos de mudar de vida e que tinhamos de mudar de vida todos. Ora um governo minoritário é o terreno ideal para o aparecimento de demagogias sectorizadas (emprego para todos, não redução das reformas, não diminuição das despesas públicas na educação, na cultura, na saúde, etc, etc) que podem vingar numa época de pretensa abastança mas são inviáveis e impossíveis de sustentar agora. Tudo isto poderia ter duas sequências: ou eleições, com o aparecimento de propostas concretas para a resolução disto que promovam desde o princípio uma politica de verdade sobre as dificuldades que temos pela frente, ou um governo de unidade nacional a partir da iniciativa do Presidente da República? Alguma pessoa de bom senso consegue, neste Estado de coisas, antever um governo de unidade nacional por iniciativa de Cavaco Silva? Ou, pela amostra que aí vem, de que os partidos possam criar um referencial político credível quando a direita e a esquerda ( tirando o PS aqui nitidamente ao centro) não têm nenhum ponto de cruzamento relevante que não seja o ataque a Sócrates. Se vier aí um novo governo Portas e Passos, Passos e Portas nada disso será novo e tudo isso será mais um passo para o abismo.
A saída disto tudo começou a ser esboçada no fim de semana passado. O povo quer que haja capacidade da sociedade se organizar para criar soluções que permitam perspectivar o seu futuro e reconhece que o quadro político convencional não é capaz de dar essa energia, essa força. Não vale por isso manipular aquilo que aconteceu no dia 12. E é preciso deixarmos de ter uma atitude competitiva e individualista ( quando me forem às minhas regalias e direitos acabou-se a conversa) e começarmos a agir mais solidariamente. Poderá um dia voltar a haver empregos para todos. Mas enquanto não houver os empregos que há têm que ser partilhados.
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