terça-feira, março 12, 2013
O sentimento de impasse e bloqueio na vida deste país - e que António Pinho Vargas bem caracterizou como resultado de um "golpe de estado" tão ilegítimo como, aparentemente legal - é mais uma janela aberta sobre a política portuguesa. Na minha vida presenciei algumas. Realidades que pareciam imutáveis e que caíram como um baralho de cartas. Quando o sistema politico parece não ter capacidade de dar resposta àquilo que são os anseios das pessoas, a ruptura surge. E surge tão naturalmente que aquilo que era impossibilidade se torna possibilidade. Dou um exemplo: muitos de nós analisamos a incapacidade do sistema democrático promover objectivamente a melhoria de vida da comunidade portuguesa como um sinal de que pode advir aí uma ditadura. Como o nosso referencial político é esse, democracia versus ditadura ou democracia versus terrorismo activamos logo o sinal de alarme. Esquecemo-nos de uma coisa: em relação à ditadura, quem quer jogar como vencedor o jogo do domínio, por mais incompetente que pareça, e por mais incompreensíveis que sejam os seus testas de ferro, teve as aulas de ciência política necessárias para perceber que é muito mais proveitoso politicamente aproveitar as possibilidades que o sistema democrático lhe dá para fazer o "golpe de estado" por dentro, como disse António Pinho Vargas. Aquilo a que chamamos ditadura já cá está, enquanto sequestro da possibilidade que uma comunidade tem de, em comum, projectar o seu bem estar. Todos nós o sentimos. E isso é muito bom, que tenhamos cada vez mais essa percepção. É a tal janela aberta sobre a política portuguesa. Quase quarenta anos de democracia política geraram uma entropia no quadro politico fornecido pelo sistema democrático. Estes novos ditadores e a corporação de interesses que representam, foram eleitos por nós e o quadro politico ( e não o sistema democrático, isso é o erro de análise em que caímos muitas vezes) tal como está, não parece fornecer nenhuma solução à vista para a mudança de orientação política. A única coisa que há a fazer é, ou ficar preso à impossibillidade de agir, e deixar que o saque do interesse e do património público continue, ou fazer o mesmo: tentar, dentro do sistema democrático, aproveitar ao máximo as possibilidades que ele dá para pressionarmos a capacidade dele agir. Temos de ser pragmáticos e objectivos neste ponto: ao mesmo tempo que o quadro político não parece fornecer nenhuma alternativa a este sistema ( quem acredita hoje em Cavaco Silva, em António José Seguro, Jerónimo de Sousa, João Semedo e Catarina Martins como actores que, sem mudança de guião, podem, por si só, mudar o quadro político, anda a fornecer-se de muito mais do que vitaminas para conseguir viver o dia a dia, cada dia), ao mesmo tempo tem havido movimentos que pese embora sejam acusados de não conseguirem criar uma significação política alternativa têm indicado o único caminho possível dentro de uma atitude não violenta e pacífica: o reforço da participação cidadã. Este reforço tem de conseguir encontrar formas de agir que se concretizem em aspectos chave para a vida da comunidade como a Justiça e a construção do Estado Social. É urgente um Fórum de cidadãos com juristas dispostos a garantir que se possa levar a tribunal os principais casos em que o interesse público tem sido tripudiado. É urgente ocupar as ruas com o nosso protesto, com a nossa existência, com a nossa festa ( e encontrar formas de prevenir a violência policial e de grupos). É urgente dar visibilidade ao movimento de cidadãos que se tem criado e àquilo que parece serem as suas pequenas causas. É urgente que surja na esquerda portuguesa um movimento político capaz de romper com o atavismo político gerado pelas sequelas do confronto politico partidário dos últimos quarenta anos. É urgente que se faça este vaivém entre a nossa capacidade de participarmos, de não aceitarmos, de criarmos uma experiência política significativa, e a mudança do quadro político que nos representa. Se os partidos existentes conseguirem fazer isso, que o façam, se não o conseguirem, que criemos novos movimentos, mais ágeis a perceber a razão do sopro e da poesia que por aqui anda na nossa revolta. Se o consumismo foi o motor do nosso atavismo, pois, agora que só nos sobram cêntimos e já nem na loja dos trezentos conseguimos dar curso ao nosso adicto consumir, tornemo-nos adictos da luta, da consciência política, do inconformismo.
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1 comentário:
Caído de pára-quedas, um abraço de parabéns ao Joaquim Paulo e um beijinho para a Helena Morais.
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