segunda-feira, abril 11, 2005
Uma voz no parapeito
Uma das razões porque, mesmo distante do estado exaltado, insisto, e insistirei, em exaltar a voz procurando essa luz que se entrevê entre a tremeliqueira, é porque, depois desse trabalho sobre e na exaltação, depois que é como quem diz, nos dias consecutivos,
ela regressa-nos à voz.
Não à voz exaltada. À voz tranquila e sussurrante, límpida de um espirito que se almeja, puro. Que se projecta na pureza. E não é que seja puro. Não, nunca foi, e se o fosse, talvez nunca sentisse esse antagonismo, esse choque que lhe advém de se deitar a sonhar-se na pureza. Não há fenómeno humano mais curioso do que a inquieta exaltação a espraiar-se pelo dentro que um corpo acomodando-se e submetendo-se aos sinais do corpo ali, sereno e tranquilo. É um diálogo como qualquer outro,
mas o facto de reunir dois irmãos quase sempre desavindos,
torna-o único, inigualável. Por exemplo, ver, ou melhor, ouvir uma voz calma, tão tranquila que quase se diria apática, dizer, amo-te é do domínio do singular, do extraordinário. E nem precisaria de dizer, amo-te, bastaria senti-lo. Porque para amar é preciso libertarmo-nos e nessa ousadia exultante,
existirmo-nos. O amor não é a história da maçã,
é a narração do existir libertado.
Nem tudo é final feliz no entanto. Sou um romântico empedernido, digo de mim para mim entretido com a minha façanhuda maneira de ver as coisas do amor e da delícia e só depois percebo a dimensão das minhas palavras: sou aquele onde o romantismo cristalizou, se fez pedra. Não precisaria de uma maldição recente para o descobrir. Eu sou aquele que fala do amor. Por isso mesmo escolhi este lugar sentado à janela, de onde vejo a multitude dos amantes.
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1 comentário:
Fascina-me a crescente necessidade que sinto de passar por este blog... e emocionar-me, fruir da lamechice de que o quotidiano nos distancia. Bem haja!
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