quinta-feira, junho 30, 2005

Criança Grande

Cinco meninas entre os 7 e os 8 anos arrastaram-me. "É urgente e secreto" disseram. Uma delas, a mais crédula e de olhos mais escuros e arregalados, esperou que todas entrassem na casa de banho com réplicas de sanita e bonecos pintados na parede. À porta, perguntou-me: "Acreditas em espíritos?". Quero ser sempre uma criança grande com as crianças pela cumplicidade em troca, mas também não consigo mentir: "Não sei, nunca vi nenhum". Segredou-me à porta, confiando que eu não me iria rir dela "Uma amiga minha disse-me que para termos a certeza que há espíritos, temos de dizer 3 palavras feias para a sanita e depois puxar o autoclismo. E há espírito se virmos um remoinho." Decidindo alinhar na descoberta, entrei e logo correram o ferrolho prateado nas minhas costas. Discutiram ainda quem diria as palavras feias e buscaram no meu olhar o consentimento. "Vá lá, não podem é ser muito feias". Com coragem e emoção a crédula carregou no autoclismo e a descarga de água lá ocorreu com tanta fúria que a salpicou. Testemunhada por gritinhos excitados a constatação do remoinho. O espírito estava ali. Fui uma adulta mesmo que mansa, feia e má: "Ohhh, isso não mostra espírito nenhum. Eles até podem existir, mas não se vêm nas sanitas!". A crédula continuou crédula, às outras demovia-as com o meu comentário. Ao passar várias vezes no corredor, nesse dia e em seguintes, reparei que a crédula lá estava de mão insistente no botão do autoclismo e a estimar sozinha a altura dos salpicos. Não nos devemos meter no assunto de crianças. Ser criança grande não é a mesma coisa que ser criança.

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