quinta-feira, junho 23, 2005

A espectacularização do autêntico

Ontem termino a noite com uma conversa animada na minha esplanada de sempre. Francisco Luís Parreira fala de que os reality shows são uma manifestação do fascismo. Ao principio parece-me uma abordagem muito excessiva. Contradigo-a. De acareação em acareação ele chega ao principal da sua tese, tal como na estética fascista os reality-shows assentam na espectacularização do autêntico. e mesmo que a palavra fascismo reporte a uma explosão de significação custos destroços poluem a conversa, há aqui algo de importante a reter e a pensar: a forma como o fascismo nos propôe a espectáculo do autêntico, disfarçado da manifestação popular, movendo-se aparentemente no território da expontaneidade, daquilo que acontece, daquilo que é, da sua legitimação popular. A promoção desta cultura inculta foi também, para o fascismo a negação da actividade crítica enquanto cultura, criando uma separação nítida entre cultura popular e toda a cultura que transportasse, com mais ou menos visibilidade e ostentação, a marca da erudição. Esse trauma inspirou o entendimento político e subsiste hoje, mesmo depois de todo o importante trabalho que na época revolucionária se fez de aproximação dos eruditos, dos intelectuais, à cultura popular. Tanto no que toca à recuperação, ao estudo como á recriação. Nos últimos dias do seu trabalho como governante Manuel Maria Carrilho veio apresentar um programa destinado à Cultura Popular. Tinham-se sobrado duas centenas de milhar de contos e em fim de festa veio com este programa que não teve força para ser mais do que a sua apresentação pública. O Ministério da Cultura nunca assumiu, integrou, teve um discurso sobre a cultura popular. Deixa-o ao desvairio das festas, das procissões, ao regabofe e ao alarido sazonal por altura dos regressos de emigrantes. E nem serve de desculpa o facto de saber que outras instituições, como o INATEL, ou as autarquias, com grandes limitações e nem sempre de forma consequente, assumem o campo da chamada cultura popular.

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