sexta-feira, fevereiro 16, 2007

Perdidos & Achados

Perdi o telemóvel. Deixei-o dentro de um taxi. Quando o constatei tive um instante de desespero. Incorporei, como uma prótese, este pequeno aparelho que me liga ao mundo. Enquanto desço a rua, faço uma rápida avaliação de perdas e danos. E fico supreeendido com a dispensibilidade deste objecto aparentemente já indissociável da minha relação com o mundo. Não havia nada de absolutamente importante que eu fosse perder por ter perdido o meu telemóvel. Eu sei, é um lugar comum, o pior são os números. Pois até nisso me contentei. Há muito tempo que me atormenta a quantidade de nomes que perduram no meu telemóvel quando já deixaram de pertencer à minha relação com o mundo. E tudo nomes que atrapalham quando precisamos de gente por detrás de um link. Acontece-me muitas vezes precisar de alguém. Não que a minha vida vá derrocar senão encontrar senão o silêncio quando uma voz me carece. É que tenho esta ilusão que a minha vida poderia ser melhor com uma conversa. Agostinho da Silva dizia que há uma rima profunda entre conversar e converter. Sou dessa religião convertido. Uma das coisas que me fez destituir a ambição como um lugar deste mundo é que ela é lugar de uma terrível e despovoada solidão. Por isso, o pior não são os números e muito menos os nomes, pensei, já o eléctrico dobrava a Rua da Madalena. Será até uma oportunidade para voltar a falar com alguns amigos. Tenho o email de quase todos os que importam. E os que não tenho, alguém os tem. Ou então, mais dia menos dia, telefonam-me. Não é por isso que a gente se perde por aí.

4 comentários:

blue disse...

Heh heh, Mercúrio entrou retrógrado ontem: tu perdes a tecnologia de comunicação, e como bom Mercúrio em Peixes, repensas os teus processos de comunicação numa perspectiva emocional ;)

sofia. disse...

Todos os números importantes acabam por se poder recuperar. Pena é as palavras que os telemóveis guardam...

Anónimo disse...

Fica-te com Agostinho da Silva onde o ganhar estará sempre muito para lá do perder referido...

Abraço

CCF disse...

Perdi a conta a quantas vezes perdi o meu e pensei dentro da minha cabeça as mesmas coisas que este texto tem lá dentro. Com uma diferença: o meu persegue-me. Volta a mim na primeira ou na segunda busca: regressa de debaixo das mesas, do abandono junto a secretárias alheias, das mãos de alguém após queda no passeio, do desprezo a que o voto pelas mesas dos cafés...agora, pela sua persistência, até já gosto dele.