sexta-feira, março 16, 2007
Memórias de um Carteiro
Tinha aterrado no EPA havia meia dúzia de dias. Eu não andava muito feliz. Tinha as minhas escapatórias, gostava de ir para a pista ver os aviões, andar nos carros eléctricos, mas o convívio com os meus colegas não me entusiasmava muito. Nem o convívio nem o trabalho. Naquele entreposto postal o mundo estava dividido em carteiros e em texes. Os texes eram os técnicos de exploração que dividiam as cartas por móveis organizados pelos mais diferentes destinos. Havia as cartas que vinham de todo o mundo e as que íam para todo o mundo. Nós ocupávamo-nos com estas últimas. Era um mundo muito hierarquizado. Os carteiros alimentavam as estantes dos texes com os tabuleiros cheios de cartas. O trabalho de um carteiro não era muito especializado. As malas de correio chegavam por tapetes rolantes e a nós só nos era pedido força bruta. Tinhamos de tirar os sacos, despejá-los em cima de uma grande mesa de metal e meter a correspondência toda em tabuleiros. O correio era dividido e depois nós íamos atar maços de cartas e voltávamos a colocá-lo em sacos, azuis. Seriam assim quase todos os meus dias não fossem dois bons amigos que entretanto tinha feito. Uma antropóloga que conhecia todos os meus amigos do teatro e um designer. Já viviam juntos e casaram-se nesse ano. Foram eles que nesse ano me ofereceram a Poesia Toda, do Herberto Hélder que foi uma autêntica revolução na minha relação com a poesia. Ela muitas vezes aproveitava os postais que vinham sem destinatário para escrever o meu nome, e uma mensagem de alento, coragem, olha a janela, que naqueles momentos era o bastante.
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A semana passada mandei-lhe um flyer de um acontecimento que estou aqui a organizar na Casa da Cultura dos CTT. Recebi de volta uma mensagem de Goa. Estava numa cabana, ao pé da praia, cheia de uma solidão maior e de repente aquela mensagem vinda de Portugal fê-la estremecer. Hoje de manhã recebo um novo email, estava no aeroporto de Bombaim à espera de voo de regresso, era só para combinar um café na nossa esplanada.
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1 comentário:
:-) Gostei de ler, um abraço, ainda te devo uma agenda...
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