segunda-feira, abril 02, 2007

Lá na terra

Lá na terra tenho uma horta. A esta altura a horta já está morta. As batatas estão podres, porque ninguém as apanha. Quando eu sair daqui, deste hospital, volto à terra. Às vezes tenho uma raiva à minha Otília, eu magro tão magro que estava e ela nunca mo disse. Só um dia destes em que estava no banho, é que percebi que os ossos dos ombros faziam força para sair e a pele estava mesmo quase a ceder. Eu não ia dizer-te que estavas muito magro, não podia. Não quero ambulâncias à minha porta, já disse. Lá em casa tenho uma caçadeira. Sou uma pessoa pacífica, não é para fazer mal a ninguém. É mais para me defender. E eu juro que se ambulâncias à minha porta, eu faço uma loucura. O campo deu-me tudo. E matou-me a fome. Fui explorado. Em tempos tive de sair de noite e ir roubar favas e batatas. E não era para vender. Era para comer. Hoje, enfiar a enxada na terra, ver a chuva cair, arrancar as ervas daninhas, é tudo o que sei fazer. Seria triste não seria? Ver os meus vizinhos a chegarem com sacos de plástico cheios de hortaliça para a Otília fazer sopa. Era bonito, mas era triste. Não há nada como as batatas da minha terra.

2 comentários:

j disse...

Triste, mas bonito. Belo.

nana disse...

tão bonito, meu amigo virtual......

mesmo
mesmo.

....

x


(ps - já sei onde te "descobri": no plan(o)alto, esse (outro) "abuso" de blog....)