quinta-feira, abril 19, 2007

O meu nome

Habituamo-nos a que uma identidade se constrói como um puzzle: nome completo, assinatura, rubrica, abreviatura, apelido, nome próprio. Ou, não havendo já cognomes, alcunhas. Nomes de rua. Nomes de ocupação. Tudo isso se faz dentro das rotinas do eu. Não causa espanto. Por vezes é um incómodo. A minha mãe antes telefonava aqui para o teatro e perguntava pelo dr. Joaquim. Eu proibia-a uma, duas, três mil vezes, sem resultado. Um dia disse-lhe que éramos os dois motivo de gozo por causa disso, que num teatro ninguém se chama Dr. ou Eng., o nome antecede e supera o título e ela deixou subitamente de o fazer. Outras vezes é sinal de algum reconhecimento. Há um vizinho meu, o que trabalha na carpintaria aqui da vila, que agora deu em dizer-me, boa tarde, Joaquim. E eu simpatizo com a ideia. Não tenho outra intimidade com ele a não ser o ter-me feito um dia uma escada e uma protecção para uma mezzanine, nem sei onde me soube o nome, mas gosto. Talvez seja como quando era miúdo e gostava de me ver ao espelho. Há no entanto algo que me emociona terrivelmente. Quando ela, nos seus dois anos e meio de gente, me olha com aqueles olhos risonhos e diz com ganas:"-Quim!". Aí viro-me para o Raul e a Paula, os pais, e sorrio orgulhoso como se tivesse finalmente encontrado a minha identidade perdida.

1 comentário:

Anónimo disse...

As nossas alcunhas de infância enclausuram a nossa verdadeira identidade, a despojada de mascaras sociais, encerram magia, nos protegem com o manto doce da intimidade.
Maria João F.