segunda-feira, agosto 06, 2007
O irmos
Dou-me conta que cresceu porque já não me pesa. Ainda se arrasta, demora a desligar o dvd, não percebe tudo à primeira, mas já não me pesa. E até me aligeira. Eu não sei se com a idade dele tinha o espirito de abnegação que ele demonstra. Não sei se seria capaz de andar assim entre dois mundos, entre dois cosmos, sem uma dor, um queixume ou um quebranto vísivel. Agarro-me, como um náufrago com o meu espectador. Ele é o meu par. Nós inventamos muitas vezes a relação quando não há relação nenhuma. Ou como dizias, andamos tão obcecados com as relações, com o termos sempre alguém que não percebemos que há pessoas que deviam mesmo estar sozinhas. Falámos nisso quando fazíamos um voo de voyaeur ao prédio em frente. Um homem semi nú diante de uma janela. De repente surge o corpo e o rosto de uma mulher. O pescoço estava esticado, foste tu que reparaste. Discutem. E acto imediato ele dá-lhe uma estalada. Ficámos mudos como se o som da pancada nos tivesse saido da pele. E depois tu disseste, ou eu, começámos a falar sem parar, sobre a dor, a solidão, a violência. E eu agora lembro-me disso, enquanto espero o taxi, o meu anjo está comigo, é tarde, ele é metade do dobro de mim. Quando me contou que queria morrer eu estremeci. Sabia que não era verdade mas ele tinha soluções: vou deixar de comer e depois morro. Mais à tarde levei-o à esplanada e escrevi uma história a explicar-lhe que quando ele tinha dito aquilo, eu tinha finalmente compreendido o que é que os meus pais sentiam quando eu me escondia no sotão e dizia que queria morrer. Ele não se escondeu no sotão mas na pequena mezzanine. E disse-lhe também que também o conseguia compreender a ele, na sua tristeza. Escrevi a história sem parar, lendo em voz alta, para o agarrar. No final desenhou-a e depois, contou-me mais tarde, deu uma gragalhada, um riso, abraçou-me e esqueceu-se de morrer.
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6 comentários:
Belíssimo!
Se caminhares sempre ao seu lado, não há por que te preocupares!
;)
descobrir este blog numa segunda-feira cinzenta d eum agosto estranho, é sinal de que há, ainda, quem escreva tão bem que me faz acreditar que às vezes estou enganada.
pai - "quero alguém"
filho - "não te basto?!"
pai - "outro alguém..."
filho - "então posso morrer?... não precisas de mim..."
pai - "NÃO FILHO! não é isso, vou precisar SEMPRE de respirar O MESMO AR que tú ..."
filho - "ah bom (risos) então já não preciso de morrer... uf!"
que bonito JP.
Que bonito!
ó amigo, os teus laços são o melhor de ti. bjeios.
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